Diogo Infante e um papel gigante
Um homem – ator, por sinal –, uma crise de meia-idade (ou terá sido ele sempre assim?), um ego gigante e narcisista que o faz admirar o seu próprio retrato em modo quase Dorian Gray, um culminar de situações em que a comédia, o drama, a homossexualidade latente, a solidão e o amor se misturam de forma caótica e hilariante. Esta é a vida de Guilherme de Andrade em “O amor é tão simples”, uma adaptação da peça de 1942 de Noël Coward, até junho no Teatro da Trindade, em Lisboa.
“Present laughter”, no original, chega a Portugal por iniciativa de Sandra Faria, com encenação do protagonista, Diogo Infante. É um caso em que a história se parece repetir: a estreia da peça escrita em 1939 foi adiada pela Segunda Guerra Mundial; a versão portuguesa esteve parada pela pandemia. Em “Present laughter”, frase de Shakespeare sobre o carpe diem, o autor era também protagonista, num papel autobiográfico. Em “O amor é tão simples” sabemos que não é um Diogo Infante autobiográfico que vemos em palco. Mas o enredo sobre os meandros do teatro e as tormentas de um ídolo assenta-lhe numa mostra do seu talento num lado em que menos o vemos, o da comédia. Infante já assumiu que foi ao ver a peça em Londres com o filho, e de este lhe dizer que a devia fazer, que embarcou no projeto. O resultado é o que se vê: um papel gigante.
Guilherme de Andrade vive uma existência fútil e displicente, acompanhada mas solitária, feita de festas onde a adulação é constante. Ele alimenta-se disso mas parece já não saber lidar com a situação. “Toda a gente me adora. É cansativo”, diz. A sua entourage, composta pela secretária Mónica, a ex-mulher Lis, o agente, o produtor, a governanta e o mordomo, é mais crítica da sua personalidade egocêntrica, mas o seu ego vence sempre, enquanto tenta desviar-se das confusões que ele próprio criou. O elenco é brilhante: Gabriela Barros, Rita Salema, Ana Brito e Cunha, Ana Cloe, António Melo, Cristóvão Campos, Flávio Gil, Miguel Raposo e Patrícia Tavares acompanham Infante nesta sátira de excessos, insinuações, maneirismos e contradições.
O amor é tão simples
TEATRO DA TRINDADE, LISBOA ATÉ 26 DE JUNHO