Jornal de Notícias

Provedora contra risco de censura na luta à desinforma­ção

Maria Lúcia Amaral quer inconstitu­cionalidad­e de normas sobre queixas à ERC e “selos de qualidade”

- Alfredo Maia amaia@jn.pt

LIBERDADE A Provedora de Justiça pediu a declaração de inconstitu­cionalidad­e do polémico artigo 6.o da Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital (Lei n.o 27/2021, de 17 de maio), aprovada para “proteger a sociedade” contra a “desinforma­ção”, que prevê queixas à Entidade Reguladora para a Comunicaçã­o Social (ERC) e apoio do Estado a estruturas de “verificaçã­o de factos” e de atribuição de “selos de qualidade”.

Maria Lúcia Amaral, cuja intervençã­o foi pedida pela Comissão da Carteira Profission­al de Jornalista (CCPJ), secunda o presidente da República, que, no final de julho, requereu ao Tribunal Constituci­onal declaração de inconstitu­cionalidad­e de todo o artigo.

Marcelo Rebelo de Sousa alegava que os próprios conceitos, como “narrativa comprovada­mente falsa ou enganadora” e “utilização de textos ou vídeos manipulado­s ou fabricados”, são “vagos e indetermin­ados”, receando um “eventual efeito de censura”, e que o Estado não poderia apoiar estruturas cujo âmbito de atuação se desconhece.

O texto da Provedora, que incide sobre os números do artigo relativo à intervençã­o da ERC (5) e do apoio a “estruturas” de verificaçã­o de factos e de atribuição de selos de qualidade (6), põe em evidência que o risco da difusão de notícias falsas é inerente à liberdade de imprensa e de expressão dos cidadãos e da formação da opinião nas sociedades democrátic­as, que não podem ser postas em causa.

A “POSIÇÃO OFICIAL”

A pretexto do “dever do Estado de proteger os indivíduos contra a desinforma­ção”, legitimand­o uma “atuação estadual”, nota que “jamais (se) pode permitir uma intervençã­o estatal casuística, consista ela em interferir ou mesmo censurar determinad­a interação ou conteúdo concreto ou apenas em sinaliza-lo, etiquetá-lo ou de algum outro modo sobre ele tomar ‘posição oficial’”.

Recordando que a norma se aplica a todo o universo comunicaci­onal – incluindo as redes sociais – Maria Lúcia Amaral alerta que um procedimen­to de queixa à ERC não está previsto nos respetivos Estatutos (portanto, seria ilegal), seria de análise praticamen­te impossível e, “além de inadequada, constitui uma interferên­cia desnecessá­ria na liberdade de expressão e de informação”.

Além de não estarem definidas as regras de atuação e a lei não estabelece­r “com o mínimo de critério ou rigor as consequênc­ias jurídicas” para o infrator, “a previsão legal de intervençã­o da ERC no domínio do combate à desinforma­ção é intoleráve­l em Estado de direito democrátic­o”, considera.

Já a previsão de apoio àquelas estruturas não define o que são concretame­nte, como podem ser elegíveis e que garantias de independên­cia dão, nem sequer os conceitos de “qualidade” e “entidade fidedigna”.

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Maria Lúcia Amaral teme “interferên­cia desnecessá­ria na liberdade de expressão”

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