A juíza que nunca veio ao Porto
Devo começar por dizer que não desconheço que há muitos portugueses e portuguesas que nunca foram a muitas das nossas mais belas localidades e começo já por mim. Apesar de já ter estado na magnífica cidade da Mêda e na estonteante Marialva , ou na badalada Vila Nova de Foz Côa, logo mesmo ali ao lado nunca fui a Penedono. E até trabalhei com uma colega que nasceu lá.
Nesta linha de pensamento temos que aceitar que também existam muitos compatriotas que nunca tenham vindo ao Porto, como haverá muitos outros, ainda que seguramente bem menos, que também nunca foram a Lisboa. Devo até confessar que conheci recentemente uma pessoa que já foi a Florença, mas também nunca foi a Lisboa, nem ao Algarve, muito menos a Penedono, à Mêda, a Marialva ou a Foz Côa. Diga-se em abono da verdade que é uma excelente pessoa e nada tenho contra esta situação.
Acontece que todos sabemos que se cada pessoa é cada pessoa e cada caso é um caso, também há pessoas e pessoas e casos e casos. É por isso que eu hoje resolvi aqui trazer o caso de uma pessoa que, sendo uma pessoa ao acaso, acaba por ser talvez até uma pessoa exemplar, mas certamente um caso exemplar. Trata-se precisamente de uma juíza que nunca veio ao Porto, até ao dia em que teve mesmo que vir, já mulher formada , por uma razão do seu interesse particular.
Quando soube isto, durante a sessão de apresentação do primeiro livro escrito pelo editor Rui Couceiro no magnífico Museu dos Reis (“Baiôa Sem Data Para Morrer”, que aliás recomendo vivamente), veio-me logo à memória o caso de mais de 100 potenciais juízes e juízas que aos 20 anos também nunca tinham vindo ao Porto. Explicando melhor, estou a falar da esmagadora maioria dos meus colegas do curso de Direito da Universidade Católica de Lisboa. Para mim, nado e criado no Porto e que nessa altura já tinha visitado Lisboa vezes sem conta, até a instâncias de visitas escolares, fiquei profundamente espantado quando percebi que a maioria dos meus colegas, na sua maioria residentes em Lisboa e na linha do Estoril, nunca tinham posto um pé no Porto. Nunca tinham visto o por do sol na Pérgola da Foz, nunca tinham posto um olho no rio Douro a partir da Ribeira, nem no Porto antigo a partir da Serra do Pilar, como também nunca tinham posto a boca numa fancesinha ou numas tripas à moda do Porto. Acreditem que nesse momento, o espanto não provocou indignação, mas tão-somente pena.
Agora, 30 anos depois, quando soube do caso desta juíza, já não consigo sentir pena de quem depois de tantos anos de vida feita, morando em Lisboa, não sente curiosidade de conhecer o que é o Porto e como são e vivem os portuenses.