Jornal de Notícias

Depois do céu e do inferno ainda há futuro para Spray?

Banda de João Paulo das Neves destacou-se nos anos 1990. Depois, mergulhou no esquecimen­to e no “wild side”. Mas há sinais de retoma a partir de Londres

- Ricardo Jorge Fonseca cultura@jn.pt

MÚSICA “A história do rock está cheia de ascensões e quedas”, diz João Paulo das Neves com conhecimen­to de causa. Podemos começar pela pergunta: quem se lembra dos Spray? Passaram abundantem­ente nas rádios e chegaram a disco de ouro em 1997 com o álbum de estreia “Pintado no luar”, feito de uma pop solarenga e orelhuda. O sucesso atraiu jornais e televisões e outros músicos e em 1999 o segundo trabalho da banda, “Salto mortal”, é produzido por Rui Reininho, que também participa no tema “Anoiteci”. Há uma quebra no entusiasmo, o disco fica longe dos resultados do antecessor. A partir daí, os Spray – que não remetem para nenhum coletivo, mas sim para os instrument­os, letras e voz de João Paulo das Neves – vão conhecer o “wild side”, forma poética de dizer que passaram um mau bocado. E agora há uma nova pergunta: irá voltar a ouvir-se falar dos Spray?

LIMPAR O NOME

João Paulo das Neves tem passado os últimos anos a apostar que sim e a trabalhar para isso. Mas convém perceber donde vem e as dificuldad­es desse trajeto. Encerrada a primeira vida dos Spray, no início do milénio, o cantor afastou-se temporaria­mente da música e foi para Cambridge estudar direito internacio­nal público. Regressou a Portugal passados alguns anos, teve uma filha e dedicou-se à paternidad­e. Depois tentou reunir uma banda e os problemas começaram. Arrasta-se até hoje uma batalha judicial em que João Paulo é acusado por três músicos de ser um “burlão” que lhes terá ficado a dever dinheiro. O músico declara-se “inocente” e garante que um dia a justiça irá limpar o seu nome. Mas a “mancha” complicou-lhe os planos desde então: “Todas as portas se fecharam, das rádios às editoras, nunca mais tive oportunida­des em Portugal”.

Inicia-se uma queda acentuada na sua vida, e em 2012 dá por si a viver na rua, primeiro no Porto, depois em Londres, onde começa a tocar numa das saídas do metro de Oxford Street para sobreviver. “Tinha por companhia os seres da noite e aproveitav­a as sopas de uma igreja”, diz João Paulo, que voltou a encontrar na música a única saída: “Consegui recompor-me graças a um emprego na British Airways e voltei a escrever e a gravar as minhas canções em casa. Depois comecei a lançar singles em plataforma­s digitais”. O primeiro desses singles, “Trash pop”, que tem a sujidade e a tensão urbana de uns Suicide em clave mais melodiosa, inscreve-se no top 100 da ReverbNati­on, tabela de referência para o indie rock britânico. Dois outros temas atingem o top, “Gimme” e “Mark II”, e em 2021 é editado “Brit”, com selo Sounds & Visions, que assinala o regresso oficial dos Spray, ainda como projeto de um homem só.

UMA NOVA CHANCE

Pelo caminho ficaram atuações no circuito de bares de Londres, destacando-se a sua colaboraçã­o com bandas como Gene Loves Jezebel e Radio Revolution. Participou numa homenagem aos Kraftwerk com uma versão de “Neon lights”. E recentemen­te lançou um novo single, “On the grounds of faith”, que conta com a voz de Danae Diogo, filha de Laura Diogo, das Doce. Aos 57 anos, João Paulo encara o futuro com otimismo e quer voltar a ascender com dois EP que serão lançados em setembro e com o quarto álbum de Spray no próximo ano. Haverá nova chance depois do “wild side”?

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João Paulo das Neves continua a dar vida ao projeto Spray, agora a partir da capital britânica

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