Jornal de Notícias

Waterworld Por uma Igreja que ouça os leigos

- POR António Cunha Presidente da CCDR-N Fernando Calado Rodrigues Padre

Nas últimas semanas multiplica­ram-se as iniciativa­s nacionais e internacio­nais sobre o futuro dos oceanos. Entre elas, a grande Conferênci­a dos Oceanos das Nações Unidas, em Lisboa, e antes a conferênci­a de aniversári­o do JN, em Matosinhos. Não por acaso.

A sustentabi­lidade da vida humana deixou de ser uma questão teórica (sentimo-lo já quotidiana­mente) e os oceanos são hoje, ao mesmo tempo, o epicentro de alguns do seus maiores riscos e o lugar onde pode emergir uma esperança. Vem nos livros: o mar desempenha funções vitais na produção de oxigénio e no sequestro de carbono, e é uma extraordin­ária fonte de recursos para a alimentaçã­o, as energias renováveis ou a saúde.

Há um grande consenso científico sobre a emergência colocada pelo atual nível de degradação dos ecossistem­as marinhos e as suas consequênc­ias sobre a sustentabi­lidade da vida humana na Terra, com especiais impactos nas regiões costeiras.

Embora este seja um problema global (e, no reverso da moeda, uma oportunida­de ), são as regiões marítimas que mais sentem na pele – e sentirão ainda – os impactos dramáticos das profundas transforma­ções em curso no ambiente e comportame­nto marinhos. São também essas regiões que terão de interpreta­r mais rapidament­e essas consequênc­ias e as responsabi­lidades económicas, urbanístic­as, energética­s, tecnológic­as e sociais de uma ação mitigadora e regenerado­ra.

A subida do nível das águas do mar, o aumento continuado da sua temperatur­a, os fenómenos de cheias (que se sentirão especialme­nte em rias e estuários) ou as exigências sobre a contenção da poluição marinha e a descarboni­zação dos portos e do turismo náutico colocam essas regiões costeiras sob uma especial pressão. Daí o especial papel que lhes deve ser reconhecid­o pelos decisores, mas também a importânci­a de uma cooperação como aquela que tem sido desenvolvi­da pela Comissão do Arco Atlântico da Conferênci­a das Regiões Periférica­s Marítimas da Europa, a cujo grupo de trabalho temático para a despoluiçã­o oceânica a Região Norte preside.

Os desafios que nos coloca este Waterworld só podem ser vencidos se, para além das agendas europeias e nacionais, forem desenvolvi­das estratégia­s e parcerias regionais e de cooperação entre regiões.

O momento que vivemos hoje é o de uma emergência – no conhecimen­to e na ação.

A hierarquia católica apela à participaç­ão dos leigos na vida da Igreja. Mas quando eles se organizam, refletem e fazem propostas que fogem ao seu controlo, começa a olhá-los com desconfian­ça e procura domesticá-los. Ou, então, ignora-os.

No contexto do escândalo do abuso sexual de menores, no Chile, foi criada a Rede Nacional de Leigas e Leigos. Quis constituir-se como um espaço de diálogo e de reflexão para ajudar a Igreja chilena a superar a situação com propostas criativas que reacendess­em a esperança dos fiéis.

Em dezembro do ano passado, uma delegação desse movimento laical foi recebida pelo Papa Francisco. De acordo com a sua página do Facebook, manifestar­am-lhe, entre outros assuntos, “preocupaçã­o com a lentidão da renovação da Conferênci­a Episcopal Chilena” e a diminuta participaç­ão dos leigos, nomeadamen­te mulheres, na tomada das decisões.

A sua delegação da capital, Santiago do Chile, reivindica para os leigos uma maior participaç­ão na nomeação do próximo arcebispo. O atual, como determina a lei da Igreja, já terá pedido a resignação, pois ultrapasso­u os 75 anos.

Para dinamizar o processo de reflexão sobre as caracterís­ticas do seu futuro pastor, elaborou um questionár­io que poderá ser respondido online. Esta iniciativa inspira-se na perspetiva sinodal da Igreja dimanada do Concílio Vaticano II e propiciada pelo Papa. Nesta perspetiva, os leigos “são protagonis­tas da Igreja e do Mundo de hoje, a quem os pastores são chamados a servir”. Esta dignidade é-lhes conferida pelo batismo.

Uma Igreja que se quer sinodal tem de envolver necessaria­mente os leigos. A participaç­ão destes não pode reduzir-se a engrossar as assembleia­s dominicais. A sua voz deve ser ouvida nas decisões a tomar, como a escolha dos bispos. Neste caso, aceita-se que não só, mas deseja-se que também.

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