Waterworld Por uma Igreja que ouça os leigos
Nas últimas semanas multiplicaram-se as iniciativas nacionais e internacionais sobre o futuro dos oceanos. Entre elas, a grande Conferência dos Oceanos das Nações Unidas, em Lisboa, e antes a conferência de aniversário do JN, em Matosinhos. Não por acaso.
A sustentabilidade da vida humana deixou de ser uma questão teórica (sentimo-lo já quotidianamente) e os oceanos são hoje, ao mesmo tempo, o epicentro de alguns do seus maiores riscos e o lugar onde pode emergir uma esperança. Vem nos livros: o mar desempenha funções vitais na produção de oxigénio e no sequestro de carbono, e é uma extraordinária fonte de recursos para a alimentação, as energias renováveis ou a saúde.
Há um grande consenso científico sobre a emergência colocada pelo atual nível de degradação dos ecossistemas marinhos e as suas consequências sobre a sustentabilidade da vida humana na Terra, com especiais impactos nas regiões costeiras.
Embora este seja um problema global (e, no reverso da moeda, uma oportunidade ), são as regiões marítimas que mais sentem na pele – e sentirão ainda – os impactos dramáticos das profundas transformações em curso no ambiente e comportamento marinhos. São também essas regiões que terão de interpretar mais rapidamente essas consequências e as responsabilidades económicas, urbanísticas, energéticas, tecnológicas e sociais de uma ação mitigadora e regeneradora.
A subida do nível das águas do mar, o aumento continuado da sua temperatura, os fenómenos de cheias (que se sentirão especialmente em rias e estuários) ou as exigências sobre a contenção da poluição marinha e a descarbonização dos portos e do turismo náutico colocam essas regiões costeiras sob uma especial pressão. Daí o especial papel que lhes deve ser reconhecido pelos decisores, mas também a importância de uma cooperação como aquela que tem sido desenvolvida pela Comissão do Arco Atlântico da Conferência das Regiões Periféricas Marítimas da Europa, a cujo grupo de trabalho temático para a despoluição oceânica a Região Norte preside.
Os desafios que nos coloca este Waterworld só podem ser vencidos se, para além das agendas europeias e nacionais, forem desenvolvidas estratégias e parcerias regionais e de cooperação entre regiões.
O momento que vivemos hoje é o de uma emergência – no conhecimento e na ação.
A hierarquia católica apela à participação dos leigos na vida da Igreja. Mas quando eles se organizam, refletem e fazem propostas que fogem ao seu controlo, começa a olhá-los com desconfiança e procura domesticá-los. Ou, então, ignora-os.
No contexto do escândalo do abuso sexual de menores, no Chile, foi criada a Rede Nacional de Leigas e Leigos. Quis constituir-se como um espaço de diálogo e de reflexão para ajudar a Igreja chilena a superar a situação com propostas criativas que reacendessem a esperança dos fiéis.
Em dezembro do ano passado, uma delegação desse movimento laical foi recebida pelo Papa Francisco. De acordo com a sua página do Facebook, manifestaram-lhe, entre outros assuntos, “preocupação com a lentidão da renovação da Conferência Episcopal Chilena” e a diminuta participação dos leigos, nomeadamente mulheres, na tomada das decisões.
A sua delegação da capital, Santiago do Chile, reivindica para os leigos uma maior participação na nomeação do próximo arcebispo. O atual, como determina a lei da Igreja, já terá pedido a resignação, pois ultrapassou os 75 anos.
Para dinamizar o processo de reflexão sobre as características do seu futuro pastor, elaborou um questionário que poderá ser respondido online. Esta iniciativa inspira-se na perspetiva sinodal da Igreja dimanada do Concílio Vaticano II e propiciada pelo Papa. Nesta perspetiva, os leigos “são protagonistas da Igreja e do Mundo de hoje, a quem os pastores são chamados a servir”. Esta dignidade é-lhes conferida pelo batismo.
Uma Igreja que se quer sinodal tem de envolver necessariamente os leigos. A participação destes não pode reduzir-se a engrossar as assembleias dominicais. A sua voz deve ser ouvida nas decisões a tomar, como a escolha dos bispos. Neste caso, aceita-se que não só, mas deseja-se que também.