Uma máquina para alongar prazo
A indefinição de um prazo para surpresas acabou. Agora, só haverá surpresas a prazo. Dois ministros de Estado bem entregues, um ministro dos Assuntos Parlamentares e outro da Presidência em que o ar se respira, a integração pesada mas justificada do Ministério do Ensino Superior na pasta da Educação, a relevância da Cultura que não cai para Secretaria de Estado e elenca um nome transversal com provas dadas, o Ministério da Defesa entregue a um líder partidário, o Ministério dos Negócios Estrangeiros colocado nas mãos de um peso político, a Coesão Territorial com uma designação de prestígio, alguns ministérios fulcrais entregues a um misto de nomes prévia e previsivelmente anunciados, assim como também a surpresas que terão de merecer o benefício da dúvida, eis o Governo com que Luís Montenegro pretende assumir e voltar a ganhar o país.
Um Governo surpreendentemente bom, difícil de montar, mesmo para muitos que lhe dão um prazo de validade de seis meses. As maiores incógnitas residem nas pastas da Justiça e da Saúde, onde o peso destes ministérios parece ter sido desvalorizado nas prioridades de Luís Montenegro. Um pouco como se perante a enorme dificuldade de resolução de alguns dossiers, o novo primeiro-ministro optasse por nomear um elenco de dúvidas que justificasse eventuais fracassos ou tolere um potencial de crescimento caso o prazo de longevidade do Governo se alongue. Se muitos nomes são estáveis e consistentes, e outros são surpresas guarda-chuva, venham então as políticas. Desconhece-se a intenção de Luís Montenegro em nomear equações para duas pastas fulcrais. Poderá ser sinónimo de desresponsabilização ou de falta de pesos-pesados que as quisessem assumir.
É um contra-senso dizer que há demasiado PSD num Governo que tinha de ser eminentemente político perante as dificuldades políticas que se adivinham. O PSD sabe que terá muito poucos meses para distribuir as benesses que Fernando Medina optou por guardar em excedente, salvo-conduto de um novo elenco que não poderá perder muito tempo a conhecer pastas. O PSD reconhece que terá de agir de imediato para causar a boa impressão e o apoio popular que lhe garanta longevidade. E isso não pode estar ao alcance de nomes inexperientes ou que tenham de interiorizar processos e medidas que politicamente não podem esperar.
A máquina era necessária e, como máquina, respondeu à chamada. Jogar pelo seguro, fazer política, não perder tempo, procurar a longevidade e estar politicamente preparado para uma eventual crise política que lhe reforce o peso específico da actual minoria. Quem esperava por um Governo autodestrutivo enganou-se.