“Há famílias sem casas e casas sem ninguém dentro”
Especialistas debatem políticas de habitação em Braga, no 8.º encontro das Políticas Públicas, Planeamento e Desenvolvimento do Território (P3DT)
CONFERÊNCIA “Não existe uma crise de habitação, existe uma crise de acesso à habitação que é territorialmente diferenciada e desigual em todo o país”, disse o geógrafo Pedro Chamusca, ontem, em Braga, no 8.o encontro das Políticas Públicas, Planeamento e Desenvolvimento do Território (P3DT), que termina hoje.
O mercado da habitação, o direito a uma casa, o mercado imobiliário e a gentrificação dos centros das cidades são alguns dos temas em debate por especialistas em várias áreas relacionadas com a construção e planeamento.
Numa análise feita aos últimos 50 anos, a arquiteta Helena Roseta, constatou que “há famílias sem casas e casas sem ninguém dentro”, tendo aumentado o número de habitações apresentadas como sendo “residências secundárias”.
De acordo com os últimos censos, há 720 mil habitações vagas em todo o país, cabendo ao Estado “promover o seu regresso ao mercado”. “O Estado deve deixar as leis do mercado funcionar, mas quando o mercado falha, o Estado tem de intervir”, disse ainda a arquiteta.
CONCEITO “DRIVE-IN”
A forma como as cidades foram e continuam a ser construídas podem (ou não) contribuir para mais e melhor habitação. “Há um conceito de drive-in nas cidades em que vamos de carro para todo o lado, entramos em casa pela garagem e, muitas vezes, nem conhecemos a entrada pedonal do prédio em que vivemos”, frisou André Cerejeira Fontes, docente na Universidade do Minho.
Para diminuir o preço das habitações e, em simultâneo, conseguir a libertação de mais casas, o arquiteto propõe, entre outras coisas, uma maior flexibilização legal que permita remodelar as habitações atuais, transformado as “exageradamente grandes em várias mais pequenas”.
As alterações à legislação atual são também uma das propostas de Rubén Lois González, docente em Santiago de Compostela. “Se na medicina e na educação, por exemplo, se aplica a ciência porque é que não se faz isso nas políticas de habitação”, questionou.
As preocupações que existem em Portugal relacionadas com a habitação são, de acordo com Luíz de Mello, diretor do departamento económico da OCDE, semelhantes às de outros países. “Os mais pobres gastam cerca de 40% do seu orçamento em despesas com arrendamento ou hipoteca”, disse. “Por causa da pandemia, as pessoas em teletrabalho deixaram as cidades e migraram para fora levando um aumento dos preços das casas nas zonas periféricas”, finalizou Luíz de Mello.
Universidade de Lisboa
“A habitação esvaziou-se de ser um direito humano básico e passou a ser um ativo financeiro. E com a gentrificação, o direito à habitação ficou ainda mais reduzido”
Ana Paula Delgado Universidade do Porto
“O mercado da habitação passou a ser, desde há alguns anos, um setor exportador”