Dor palestiniana é a imagem do ano para a World Press Photo
Fotografia do repórter da Reuters Mohammed Salem eleita pelo júri. Retratos sociais e políticos de Madagáscar, México e Ucrânia também premiados
FOTOJORNALISMO “Uma mulher palestiniana abraça o corpo da sua sobrinha” é a Fotografia do Ano, de acordo com a World Press Photo. O júri do conhecido prémio de fotojornalismo distinguiu a fotografia do repórter palestiniano da agência Reuters Mohammed Salem que capta o instante em que Inas Abu Maamar, uma mulher de 36 anos, embala o corpo de sua sobrinha Saly, de cinco anos, morta, juntamente com a mãe e a irmã, quando um míssil israelita atingiu a sua casa, em Khan Younis, na Faixa de Gaza ocupada.
Apesar da destruição em massa no território palestiniano desde o início da operação militar de Israel, como retaliação ao ataque do Hamas a 7 de outubro de 2023, a foto escolhida prima pela contenção. Neste “momento poderoso e triste que resume no sentido mais amplo o que se passa na Faixa de Gaza”, como descreve Mohammed Salem, o júri valorizou a forma como a fotografia aborda “com cuidado e respeito” a dor palestiniana, “oferecendo ao mesmo tempo um vislumbre metafórico e literal de uma perda inimaginável”.
Para Salem, fotógrafo que já tinha sido premiado pela
World Press Photo há uma década, o episódio revestiu-se de um simbolismo adicional, porque a imagem foi captada poucos dias após o parto da sua própria esposa.
AMOR EM TEMPO DE GUERRA
Depois de, no início do mês, terem anunciado os 24 vencedores regionais, os organizadores divulgaram ontem, em Amesterdão, os quatro prémios principais a concurso. Além da fotografia do ano, a escolha recaiu ainda sobre a História Fotográfica do Ano. Da autoria do sul-africano Lee-Ann Olwage, “Valim-babena” aborda o estigma a que são sujeitas em Madagáscar as pessoas com sinais de demência, que apresentam graves sintomas de perda de memória.
“A história aborda uma questão de saúde universal através das lentes da família e do cuidador. A seleção de imagens é composta com carinho e ternura, lembrando aos espectadores o amor e a proximidade necessários em tempos de guerra e agressão em todo o Mundo”, justificaram os membros do júri.
Já a categoria “Projeto de Longo Prazo” galardoou o fotógrafo venezuelano Alejandro Cegarra para uma reportagem no “The New York Times” e na “Bloomberg” em torno da mudança nas políticas de imigração do México, que se traduziram em dificuldades acrescidas para quem tentou entrar naquele país e puseram em xeque a imagem de nação historicamente aberta a migrantes e requerentes de asilo na sua fronteira sul.
A partir da sua própria experiência de migração, Cegarra dedicou-se durante cinco anos à reportagem “Os dois muros”, construindo “uma perspetiva sensível centrada no ser humano e na resiliência dos migrantes”.
A guerra na Ucrânia – cujo drama deu origem à Foto do Ano em 2023, sobre o bombardeamento aéreo a um hospital em Mariupol – também não foi esquecida.
No segmento “Formato Aberto”, Yulia Kochetova foi distinguida com o projeto “A guerra é pessoal”. Combinando imagens fotográficas com poesia, clipes de áudio e música em colaboração com um ilustrador e DJ, a fotógrafa criou um site que alia o fotojornalismo ao estilo de documentário pessoal de um diário para mostrar o que significa viver com a guerra no dia a dia, como se o absurdo fizesse parte da realidade.
Num Mundo mergulhado em conflitos e numa polarização crescente da opinião pública, a escolha anual levada a cabo pela World Press Photo “pode ajudar a criar compreensão mútua e a promover a discussão, ao mesmo tempo que cultiva “o apreço pela fotografia de Imprensa de alta qualidade, o que ajuda a abrir espaço para fotógrafos como estes trabalharem com mais segurança”, disse Fiona Fields, editora de fotografia do “The Guardian” presidente do júri.