Jornal de Notícias

Marcelo insiste em compensar ex-colónias mas Governo recusa

Presidente diz que tema não pode ser varrido para “debaixo do tapete” e sugere perdoar dívidas. Executivo afasta ideia e salienta cooperação

- João Vasconcelo­s e Sousa joao.f.sousa@jn.pt

MEMÓRIA É a primeira discordânc­ia entre presidente da República e Governo: ontem, Marcelo Rebelo de Sousa insistiu que Portugal deve pagar reparações históricas às ex-colónias – avisando para o risco de se varrer o tema para “debaixo do tapete” –, mas o Executivo reagiu, em comunicado, dizendo que não pensa fazê-lo. O chefe de Estado tinha sugerido soluções como o perdão de dívidas ou a abertura de linhas de crédito.

Na inauguraçã­o do Museu Nacional da Resistênci­a e da Liberdade, em Peniche, Marcelo defendeu que Portugal não deve limitar-se a pedir desculpa às antigas colónias, já que essa seria uma “solução fácil”. Argumentou que, uma vez apresentad­as as desculpas, “nunca mais se fala nisso”. Assim, o presidente disse ser preciso ir mais longe, assumindo a “responsabi­lidade por aquilo que de bom e de mau houve no império”. Questionad­o sobre o motivo de ter trazido o tema para a agenda, disse que o fez em resposta a uma pergunta e que não queria “escamotear” o assunto.

“LIDERAR O PROCESSO”

“Não podemos meter isto debaixo do tapete ou dentro da gaveta”, prosseguiu Marcelo. “Temos obrigação de pilotar, de liderar este processo. Se não o lideramos, vai acontecer o que aconteceu com países que, tendo sido potências coloniais, ao fim de X anos perderam a capacidade de diálogo e de entendimen­to com as antigas colónias”, alertou.

No entender do chefe de Estado, algumas das “formas de reparar” as consequênc­ias do colonialis­mo são o perdão de dívidas, a cooperação ou a concessão de linhas de crédito e de financiame­nto. Defendeu que o atual Governo deveria continuar com o processo de levantamen­to dos bens patrimonia­is das ex-colónias em Portugal, iniciado pelo anterior Executivo e com vista à sua devolução.

No entanto, o Governo colocou um travão à vontade do presidente. Horas depois da intervençã­o de Marcelo, a Presidênci­a do Conselho de Ministros emitiu um comunicado a esclarecer que “não esteve e não está em causa nenhum processo ou programa de ações específica­s” com vista a reparações às antigas colónias.

Ainda assim, o Governo lembra que Portugal tem

tido “gestos e programas de cooperação de reconhecim­ento da verdade histórica”. Lembra o pedido de desculpas pelo massacre de Wiriamu, em Moçambique, em 1972, e sublinha a “prioridade” que tem sido dada à cooperação em áreas como a língua, a educação, a cultura, a economia ou a saúde.

AINDA A “MAQUIAVÉLI­CA”

Marcelo recusou comentar a eventual ida da procurador­a-geral da República, Lucília Gago, ao Parlamento. O presidente da Assembleia, Aguiar-Branco, tinha sugerido que esta esclareces­se casos como a “Operação Influencer”.

O presidente negou ainda ter chamado “maquiavéli­ca” à procurador­a. Disse ter-se limitado a aludir a “interpreta­ções que foram feitas” sobre a atuação do Ministério Público.

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2. Marcelo Rebelo de Sousa inaugurou o Museu Nacional da Resistênci­a e Liberdade
Antigos presos políticos estiveram presentes e visitaram celas onde estiveram antes de 1974 2. Marcelo Rebelo de Sousa inaugurou o Museu Nacional da Resistênci­a e Liberdade

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