O insustentável abuso dos direitos
A liberdade de expressão e informação, de Imprensa, de reunião e de manifestação, de consciência e de associação são direitos constitucionalmente garantidos e que nos foram devolvidos com a Revolução de Abril. Antes, a criatividade cultural, nomeadamente através da escrita e do teatro, e a informação veiculada pelos média eram persecutoriamente sujeitos a censura prévia, remetidos para o “índex” se feriam a “sensibilidade” autocrática, ultraconservadora e retrógrada “do poder”. O lápis azul servil de um cínico e perverso falso pudor cortava, acriticamente, qualquer tentativa de liberdade dos autores que mostrassem ousadia na crítica social, política, económica ou mesmo religiosa. Obras de Natália Correia, Sttau Monteiro e tantos outros foram sacrificadas à ignorância dos censores. Qualquer notícia que pudesse pôr em causa o pensamento único era proibida. Reuniões e manifestações pacíficas eram vetadas, a não ser que se destinassem a exaltar o regime. As chamadas repúblicas coimbrãs, casas de habitação de estudantes universitários em autogestão, eram frequentemente visitadas e revolvidas em busca de documentos ou livros contrários à política do regime, detendo sem qualquer mandado judiciário e a qualquer hora do dia ou da noite os “revolucionários”. Assim eram considerados os estudantes que procuravam aprofundar o seu conhecimento do Mundo, para além das regras que lhes impunham um estudo limitado no país. Hoje, todos temos o direito de exprimir e divulgar livremente o pensamento, pela palavra, imagem ou por qualquer outro meio. Exercita-se diariamente o direito de informar e ser informado. É garantida a liberdade de Imprensa e qualquer cidadão pode constituir associações. Mas, atenção, todas estas liberdades têm como limite a salvaguarda e a defesa dos direitos dos outros, da democracia e o respeito pelas liberdades e garantias pessoais. A democracia nunca está definitivamente adquirida. Cada dia necessita de ser alimentada pela responsabilidade e cidadania de cada um de nós, defendida com fervor e convicção dos ataques e abusos cometidos por agentes radicais que a usam e dela abusam apenas para a destruir. O limite admissível, a linha vermelha é traçada pelas liberdades e garantias colectivas e pessoais do outro e, se ultrapassada, constitui abuso do direito. Não se pode admitir que pessoas façam pretensa justiça por mãos próprias, que nas redes sociais, nos média, em comícios, associações e partidos sejam divulgados discursos e práticas violentas contra o outro, porquanto esses só pretendem defender objectivos autoritários, neonazis, xenófobos, racistas e de perseguição política, cultural e religiosa. Todos estes desmandos intoleráveis são proibidos e puníveis na CRP e na lei ordinária, em defesa de uma comunidade que escolheu ser uma República baseada na dignidade da pessoa humana, empenhada na construção e consolidação de uma sociedade livre, justa e solidária.