O Espírito dos Tempos
NREMATAR POR CIMA
a política regional, ficamos com a sensação de que a bola é redonda para uns e quadrada para outros. E se a equipa da casa precisou, em tempo recente, de reforçar o plantel para continuar a assumir o jogo, a equipa adversária, que tanta promessa deixou no ar, mantém uma estranha apetência para se comprometer no fora-de-jogo e pelo tentar vencer os jogos pela via da secretaria. Isto agravou-se depois de uma série de derrotas amargas quando o novo avançado – coqueluche contratada e em meteórica ascensão municipal – sucessivamente isolado, andou a atirar, desastrada e invariavelmente, por cima. Não há adepto, nem coração, que resista a pontas-delança com alergia ao golo. Mas o que explicará tanto falhanço? Será um mero problema de treinador? Não se sabe. Na realidade, na equipa adversária há vários treinadores em acção, pelo que é difícil descortinar o que é culpa de uns e o que é resultado de outros. Dê por onde der, com extracomunitários à frente de certos departamentos, o problema não é de raízes (ou da falta delas), é antes do desconhecimento sobre o modo como a bola rola nas ilhas. Há quem tente disfarçar a falha manipulando jornais e jornalistas e contando histórias sobre jogos e episódios que nunca existiram para além da imaginação. Só que nas ilhas a redondinha é caprichosa e muito matreira. E quando em determinados campos, os adeptos sentem a ameaça, eles sabem que nesse momento só há uma cor: a cor da Autonomia. E essa cor não admite, nunca admitiu, golos na própria baliza.
O DESENHO TÁCTICO
São precisos dois para dançar o tango. Mas para dançar o futebol, um movimento composto mais complexo, são precisos 11 para enfrentar outros 11. É isso que permite gerar coreografias tão engraçadas como a célebre 4-3-3, a 4-2-4, a 4-4-2, ou as WM ou MW do século passado. No fim das contas, não ganha o tango, mas ganha a Alemanha, como Gary Lineker, um predador inglês resignado, reconheceu perante a eficácia da selecção alemã. E se tem sido mais ou menos assim no futebol, o que dizer em tempos de Covid-19? Aqui a Alemanha também parece somar goleadas. Primeira de todas a recomeçar o futebol dito civilizado, é também a primeira de todas a pôr ordem em casa: na sua e, por arrasto, na dos outros. Graças à Alemanha de Merkel, a Europa ainda é Europa. E que grandeza, que magnanimidade, tem esta Chanceler. Faz lembrar um Matthias Sammer ou um Lothar Matthäus, jogadores de outros tempos que passavam a vida a tapar os buracos dos outros, enquanto faziam de farol, abriam estradas e construíam pontes. Consistência, trabalho, solidariedade, entrosamento, foco, eis a receita do "milagre" alemão. Porque no futebol não é preciso tocar muitas vezes no esférico, tal como na política não é preciso falar muitas vezes, para se ser o homem, ou a mulher, do jogo. E se no primeiro é preciso saber passar e rematar no momento certo, na segunda é preciso saber liderar e decidir no tempo apropriado. Com a Alemanha em campo, é sempre a aprender.
A POLÍTICA DO ANTIJOGO
No campo municipal, o quotidiano não está fácil. Depois de uma resposta muito ténue às necessidades do concelho para tentar minimizar os efeitos negativos da pandemia, a equipa rosa, pressionada pela equipa laranja, ameaça dar falta de comparência na jornada da próxima segunda-feira. Em causa estão as propostas políticas que vão ser apresentadas pela equipa laranja, com intuito de repor, ou ajudar a repor, alguma normalidade no município. A situação gera embaraço na equipa rosa e um emaranhado de desculpas peculiares. Ou não se faz mais por causa do chumbo do orçamento (que estranhamente tem 100 milhões disponíveis e que nunca falta para outras coisas, incluindo para desterrar em fogo-de-artifício que não se podia ver). Ou, nova possibilidade trazida pela pandemia, não se faz reunião porque não há condições de segurança sanitária para a realização da mesma (embora haja condições sanitárias para reinaugurar um parque infantil e convidar só adeptos rosa). Ou ainda, outra quase originalidade, a assembleia municipal é ilegal (um subterfúgio tão ridículo quanto evidente). Ora, quem quiser enfia a carapuça e é complacente com argumentos que vão do cómico ao rebuscado. Mas um momento de atenção torna o cenário transparente: nesta contenda, há os que querem encontrar soluções (a equipa laranja) e há os que querem arranjar problemas (a equipa rosa). Quem quer soluções, vai a jogo e leva argumentos; quem quer problemas, fomenta o antijogo e inventa lesões. Ainda assim, para os distraídos, convém lembrar que o árbitro (o povo) está atento. E é soberano.
Bruno Miguel Macedo escreve ao sábado, de 4 em 4 semanas