Bares da poncha na mão dos clientes
Reportagem do JM confirma incumprimentos de consumidores que não usam máscaras, bebem à porta dos bares e ignoram outras regras. Donos de estabelecimentos na Serra de Água, no Funchal e no Poiso admitem que nem sempre conseguem controlar abusos.
Os bares onde habitualmente se criam ajuntamentos dizem-se reféns dos clientes. É que, conforme explicam, tudo fazem para que as medidas emanadas pelo Governo Regional sejam cumpridas da íntegra. Acontece que se uns clientes fazem tudo conforme a lei e até agradecem os cuidados tomados, outros, por força do álcool ou das suas ideias, insistem em não respeitar as ordens. São chamados à atenção muitas vezes e, também aqui, se há quem acate à primeira advertência, outros há que vão reagindo negativamente e que deixam os proprietários e funcionários exaustos, não pelo excesso de trabalho, mas sim por terem de andar ‘armados’ em fiscais, sempre de olho em cima de todos os clientes. Esta ideia foi transmitida, ontem, ao JM, numa ronda que efetuámos por alguns conhecidos bares da poncha da Região, embora alguns deles tenham recusado falar e nos remetido para o presidente do Governo Regional.
”Vá perguntar ao Miguel Albuquerque!”, atirou o proprietário de um estabelecimento de venda de poncha localizado por entre o arvoredo das serras de Câmara de Lobos. Instado a comentar as novas medidas do Executivo madeirense e que vão no sentido de apertar com aqueles que andam a consumir qualquer tipo de bebida ou a comer de pé, em ajuntamentos, encostados nos bares, o homem, de barrete de orelhas e a descascar um amendoim, mostrou-se incomodado com a nossa presença e lá foi dizendo que os comerciantes não têm nada que falar. “Quem deve explicar é o Miguel Albuquerque. Vá com ele”.
Mais à frente, na Serra de Água, Ana Vicente disse estar a par das novas medidas e tudo estar a fazer para que os clientes cumpram. Aliás, à hora da passagem da nossa reportagem, Ana Vicente colocava, com ajuda, fitas a barrar as mesas de pé alto que se encontravam na rua, junto ao estacionamento. Ou seja, preparava já este fim de semana. É aos fins de semana, como é óbvio, que se regista o maior movimento. Aliás, Ana Vicente desta o facto de, mesmo durante a semana, passarem muitas horas com um ou dois clientes. Uma ou duas mesas ocupadas. De repente, e à mesma hora, chega tudo de uma vez. No balcão, já muito que ninguém é autorizado a ficar. Pede, paga e vai para a rua. E aí é que é pior.
“É difícil controlar toda a gente e nem todos estão com vontade de respeitar o que pedimos”, disse. Ainda assim, garantiu que não tem tido problemas de maior e que até na hora do fecho de portas, quando abordados, os clientes abandonam o local de imediato. Sobre as medidas em concreto, não esconde que estão a prejudicar ainda mais o negócio mas afirma que se é para ‘atalhar’ o problema da pandemia, que prefere perder dinheiro do que ver os números de infeções por covid-19 continuarem a subir. “Temos de aceitar. Sabemos que é para o bem de todos”, afirmou em declarações ao JM.
De volta ao Funchal, no Castrinhos, na zona do Pinheiro das Voltas, Anselmo Castro, um dos sócios, é categórico: “É mau para nós mas, para alguns clientes, tem de ser assim. Há quem continue a achar que esta pandemia é uma brincadeira. E não é. Estamos perante um grave problema de saúde pública. Se estamos a sentir o peso? Estamos. Se estamos a sentir quebras significativas? Estamos. Mas se estas medidas - dizem as autoridades de saúde - são para controlar a situação pandémica, então estamos prontos”.
Anselmo Castro lamenta que muitos clientes, teimosos, continuem a questionar, por exemplo, a eficácia do uso da máscara. Assim que Miguel Albuquerque anunciou a proibição do consumo de pé, o estabelecimento começou a aplicar a regra e houve quem protestasse. “Dizem que ainda não está no papel. Nós estamos a aplicar as regras todas. Queremos ter o nosso negócio, sim. Mas não queremos ser responsáveis ou que nos apontem o dedo como responsáveis da propagação da covid-19”.
Agora que as medidas, cada vez mais restritivas, estão a acabar com muitos negócios, “lá isso estão”. Da parte do Castrinhos, se o número de clientes continuar assim, “vamos fechar para férias”. Aliás, já quatro colaboradores estão de férias. A ideia é tentar aguentar as pontas o máximo possível sem chegar a mandar ninguém para casa de vez. Anselmo Castro diz que nunca se pensou que a pandemia iria afetar tanto tempo populações inteiras, mas refere
que, assim que o drama passar, “vamos estar cá para voltar a ver os nossos clientes de regresso e com saúde”.
Das zonas baixas do Funchal, para uma zona bem mais alta: Poiso. Ali, o movimento é pouco. Aproxima-se a hora de fechar o estabelecimento por causa do recolher obrigatório. Hélio Cabral, por entre uma esfregadela nos copos e um olhar de soslaio para a equipa de reportagem do JM, refere não acreditar que haja um negócio que concorde com tanta restrição. É que, conforme explica, os clientes vão escasseando cada vez mais. Ainda assim, também Hélio Cabral admite que há clientes, que por muito que se alerte, continuam a desobedecer. “E quando estão com os copos, são mais teimosos. Mas o que vamos fazer? Temos de ir nos adaptando e tentando resolver a bem”, conta. Hélio Cabral admite que é difícil controlar as pessoas no sentido de as obrigar a se sentar ou a cumprir o distanciamento, mas refere que tanto ele como todos os colaboradores não param de falar no mesmo assunto, vezes sem conta, ao longo do dia.