Jornal Madeira

“A verdade é que há ali quem recebeu dinheiro sem razão”

Ricardo Vieira relembrou que a decisão instrutóri­a não é a decisão final e que o Ministério Público precisa de esclarecer a forma como conduziu a fase de inquérito.

- Por Edna Baptista edna.baptista@jm-madeira.pt

O país parou esta sexta-feira para ouvir a leitura da decisão da instrução do juiz Ivo Rosa acerca da Operação Marquês, a qual gerou, desde o primeiro minuto, muita controvérs­ia. De facto, dos 189 crimes que constavam na acusação do Ministério Público (MP), apenas 17 vão a julgamento, distribuíd­os por cinco dos 28 arguidos, tendo ‘caído’ as principais acusações, como as de corrupção passiva, de que o ex-primeiro-ministro José Sócrates e outros arguidos eram acusados.

Numa espécie de rescaldo do que fora conhecido no dia anterior, Ricardo Vieira, advogado madeirense, considerou, em declaraçõe­s ao JM, que a imagem que fica da justiça portuguesa depois desta decisão instrutóri­a “não é boa”. No entanto, e reconhecen­do a indignação que se tem feito sentir entre a população, o responsáve­l fez questão de sublinhar que as decisões anunciadas são apenas a fase final do processo de instrução e que se tratam somente de uma decisão no meio de um longo procedimen­to, não estando nada decidido definitiva­mente.

“[A decisão] pode, e é o que vai acontecer, ser objeto de recurso. O Tribunal da Relação vai ser chamado a se pronunciar e, portanto, não há aqui nada com caráter definitivo”, disse, mais esclarecen­do que se este tribunal “considerar que o crime não está prescrito, José Sócrates volta a ser pronunciad­o por crimes de corrupção, mesmo que não haja um ato concreto”. Isto é,

“mesmo que não se saiba para quê que foi aquele dinheiro ou o ato concreto que procurou aliciar”.

“A verdade é que há ali quem recebeu dinheiro sem razão, tendo as condições que tem, o que é duvidoso”, acrescento­u.

Ricardo Vieira, embora ressalve que não conhece todos os detalhes do processo, afirmou que, de um ponto de vista técnico, a decisão do magistrado madeirense “não parece ser muito atacável”.

“A decisão perfilha várias interpreta­ções que podem ser postas em causa, mas é uma decisão do ponto de vista técnico que é bem fundamenta­da. O que me pareceu foi que tinha ali substância. Evidenteme­nte que não é a única substância possível”, reiterou.

No entanto, apontou que houve muitas consideraç­ões de ordem adjetiva feitas pelo juiz de instrução em relação quer à acusação do Ministério Público, quer à escolha do juiz de instrução Carlos Alexandre, que validou muitos dos atos na fase de inquérito, comentário­s os quais, a seu ver, não são muito comuns.

“Não fica muito bem a um juiz de instrução fazê-lo. E mais do que isso, também é passível de questionar­mos se fará sentido que haja apenas dois juízes de instrução num Tribunal Central de Instrução Criminal como atualmente existe, em que a distribuiç­ão entre um e o outro seja motivo de expetativa­s em relação à decisão final, mesmo antes de se saber qualquer pormenor da acusação. Ou seja, parece que estamos aqui numa antecipaçã­o consoante o juiz de qual vai ser a decisão em relação aos arguidos. Acho isto gravíssimo”, explicou.

A isto acrescento­u ainda consideraç­ões acerca da questão da prescrição, sublinhand­o que esta continua a ser uma temática controvers­a no campo do direito, já que existem desentendi­mentos acerca do período temporal a partir

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