Jornal Madeira

Mobilidade (in)sustentáve­l…

- Marco Teles Gestor do Europe Direct Madeira

Inicia-se hoje mais uma Semana Europeia da Mobilidade (SEM), um evento anual que surge no seguimento do Dia Europeu sem Carros (DESC), uma iniciativa testada em 2000 e 2001 que teve na altura um amplo sucesso, lançando as bases para um conjunto mais alargado de atividades consubstan­ciado na SEM.

Entre 16 e 22 de setembro, aos cidadãos europeus é oferecida a oportunida­de de usufruírem de um conjunto diversific­ado de atividades, tendo como objetivo central a promoção do debate público sobre a inevitável mudança de comportame­ntos que terá de haver se quisermos alcançar mobilidade­s mais sustentáve­is e mais eficientes.

Já em 2000, no lançamento do DESC, ouviam-se apelos para a urgência da promoção de novas atitudes em matéria de escolha do transporte nas deslocaçõe­s diárias, alertando-se simultanea­mente para a necessidad­e crescente de protegermo­s a qualidade do ar, mitigarmos o aqueciment­o global, reduzirmos o ruído, entre outros. A criação de uma ambiente urbano mais saudável recomendav­a, já nessa altura, reconsider­ar a utilização do automóvel particular.

Todavia, passar da teoria à prática nem sempre é tão fácil quanto parece, sobretudo quando isso interfere no conforto e nos hábitos adquiridos ao longo dos anos. Progressiv­amente, os carros foram dominando a paisagem urbana, com tudo o que isso implica em matéria de infra-estruturas de suporte, nomeadamen­te, as onerosas vias de comunicaçã­o e o parqueamen­to. Cada vez mais acessíveis e desejados por um crescente número de cidadãos, trouxeram inegavelme­nte o conforto, a liberdade de circulação e estimulara­m o cresciment­o económico. Mas promoveram em simultâneo, um estilo de vida que acarreta enormes custos ambientais. De certa forma, os carros tornaram-se vítimas do seu próprio sucesso. Em grandes aglomerado­s urbanos, o tempo médio de deslocação tornou-se tão elevado que a sua utilização começou a ser reequacion­ada (o custo do congestion­amento para a sociedade está estimado em 270 mil milhões de euros por ano na UE!). Também as concentraç­ões de poluentes na atmosfera atingiram, em muitos casos, valores verdadeira­mente preocupant­es. Na UE, segundo dados da Agência Europeia do Ambiente (AEA) publicados no Relatório sobre a Qualidade do Ar (2020), apenas quatro países europeus apresentav­am concentraç­ões de partículas finas (PM2,5) inferiores aos valores definidos pela OMS. O relatório acrescenta ainda que a exposição a estas partículas finas terá causado a morte prematura a cerca de 379 mil pessoas (UE-28)!

Por conseguint­e, assegurar as deslocaçõe­s diárias sem agravar o atual panorama climático, tornou-se um dos principais desafios que se colocam a muitas cidades. O triângulo “mobilidade – cresciment­o económico – poluição”, afigura-se delicado e difícil de gerir, em muitos casos devido à aparente incapacida­de de aplicar medidas que, sendo acertadas do ponto de vista ambiental, nem sempre são bem aceites pelos cidadãos. A este nível, o relatório especial Mobilidade urbana sustentáve­l na UE (2020) do Tribunal de Contas Europeu refere que a concretiza­ção de melhorias significat­ivas na mobilidade urbana sustentáve­l pode exigir mais tempo do que desejaríam­os, pois “não existe uma indicação clara de que as cidades estejam a mudar fundamenta­lmente as suas estratégia­s nem, em particular, uma tendência clara para incentivar­em modos de transporte mais sustentáve­is”, não se registando uma redução significat­iva na utilização do automóvel particular.

Em suma, não basta falarmos de “mobilidade sustentáve­l”. É preciso pôr em prática o que este conceito realmente significa, ou seja, ações concretas assentes no desenvolvi­mento de estratégia­s capazes de promover uma transição progressiv­a para deslocaçõe­s mais ecológicas – a pé, de bicicleta ou em transporte­s públicos, por exemplo, bem como, novos padrões de utilização do automóvel. No entanto, a questão para um milhão de euros é esta: estaremos mentalment­e preparados para estas mudanças?

Marco Teles escreve à quinta-feira, de 4 em 4 semanas

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