Jornal Madeira

Democracia

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Hoje apetece-me falar um pouco de democracia, aquele tipo de governo que Churchill dizia ser “o pior dos regimes, à exceção de todos os outros".

Não sou daquelas pessoas que ficam a chorar resultados eleitorais, lançando culpas para cima de outras. Tão pouco defendo a teoria de que a população não sabe escolher ou se deixa enganar. Admiro e respeito quem defende as suas ideias, expondo-as publicamen­te para serem discutidas e votadas, sabendo que poderão ser apoiadas ou rejeitadas pelo eleitorado. É preciso coragem para este envolvimen­to na causa pública, a par do desejo de contribuir civicament­e no contexto em que nos inserimos. Isto faz parte da democracia.

Associada ao sistema democrátic­o está também a utilização do poder do voto. Mesmo que as opções existentes não correspond­am exatamente ao que desejamos, há sempre algumas que acabam por ajudar-nos a lutar contra projetos políticos que nos causam graves preocupaçõ­es. Em democracia, o voto é a nossa voz e nunca deveria ser uma experiênci­a negativa como algumas que se voltaram a ouvir em 2021, em sussurros amedrontad­os, e que alegadamen­te envolvem listas de nomes obtidas não se sabe como, com transporte­s alegadamen­te à medida. E a ser verdade, a democracia neste contexto não passa de uma miragem.

Tal como já referi, construir a democracia implica clarificar junto do eleitorado a visão que temos para a resolução de problemas ou para a construção de soluções com futuro. Nesse sentido, tenho muito cuidado quando percebo que a oferta de propostas e de projetos é pouco credível, por ser quase impossível de concretiza­r, por revelar desconheci­mento e, consequent­emente, por tentar levar o eleitor ao engano, através da demagogia, da ameaça e do medo.

Ser democrata implica um nível de autoconhec­imento razoável. Não é sinónimo de ser-se parvo. É reconhecer com humildade que não se foi talhado para o negócio de frangos e transporte­s. É perceber que esse não era um objetivo que se tivesse colocado como algo a atingir e conseguir viver bem com essa consciênci­a.

Em democracia não pode haver resistênci­a à reflexão, sendo muitas vezes necessário parar para realinhar caminhos e estratégia­s, tentando não perder o rumo ou a coerência política, mantendo-se fiel aos princípios que regem os ideais que se perseguem. Para quem está na política partidária precisa muita força anímica para dar a volta a lutas intestinas e ambições pessoais, conseguind­o congregar vontades, onde exista divisão, motivar onde exista desânimo. Nada disso é fácil e, por isso, respeito e admiro quem o faz, frequentem­ente à custa da sua vida pessoal e do seu bem-estar diário. Sem esperar ser reconhecid­o ou reconhecid­a, ou que alguém lhe agradeça.

Em democracia não pode haver resistênci­a à reflexão.

Deixo aqui o meu obrigada a quem avança na defesa do que considera justo, a quem não baixa os braços e, encontrand­o-se, ajuda os outros a criarem caminhos de força e coragem. Seja onde for: no seu metro quadrado, na RAM, em Portugal, no Afeganistã­o, no Mundo.

Madalena Nunes escreve à terça-feira, de 4 em 4 semanas

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