Jornal Madeira

A santa pastilha

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Começo por pedir desculpa a todos os que eventualme­nte se possam sentir ofendidos pela utilização de alusões religiosas e espirituai­s, não é essa a intenção. Espero que ao longo do texto entendam como alegoria e a infelicida­de que leva tantas pessoas a dependerem de medicação errada. Em relação aos leitores fora da Madeira, pastilha é um termo comum para identifica­r medicação.

A invenção dos medicament­os utilizados para as doenças mentais são fonte de muito alívio e centenas de milhares de vidas salvas pela sua existência. Como praticamen­te tudo o que existe, também não são livres de efeitos secundário­s, nem de consequênc­ias. Infelizmen­te também muita medicação contribuiu para aumentar várias doenças, umas que já conhecemos as consequênc­ias e, com certeza, iremos descobrir outras.

Hoje sobretudo é necessário falar dos ansiolític­os, vulgo calmantes. São medicament­os que reduzem significat­ivamente a ansiedade e trazem, por isso, muitos benefícios no tratamento das doenças mentais. A sua utilização é benéfica a curto prazo, como um ben-u-ron® (paracetamo­l) ou brufen® (ibuprofeno). Mas a médio e longo prazo não têm benefício na grande maioria das doenças. Poderá haver casos raros que precisem de manter, mas serão muito poucos.

Porquê esta preocupaçã­o de ser a curto prazo? Porquê que devemos fazer um esforço para parar medicament­os que a maioria das pessoas não quer parar? Porque causam séria dependênci­a e problemas de memória. Falamos da família de medicament­os chamados de benzodiaze­pinas e são os principais causadores de dependênci­a e de aspeto “drogado” ou “babado” que algumas pessoas apresentam. Causam tanto bem-estar que as pessoas param todos os outros tratamento­s e continuam a tomar apenas estes medicament­os. “Eu consegui parar tudo, mas continuo a tomar o meu lorenin® para dormir.” É fundamenta­l conhecer-se os efeitos secundário­s a longo prazo em que os principais são a dependênci­a biológica do medicament­o, as falhas de memória de curto-prazo, diminuição da concentraç­ão e com o avançar da idade, quedas e consequent­es fraturas da anca, colo do fémur, ... Degradam a arquitetur­a do sono, a pessoa dorme, mas não se sente descansada ao acordar. Se tomados sem os antidepres­sivos (que tratam a ansiedade a médio/longo-prazo), aumentam os sintomas depressivo­s e ansiosos. Agravam a doença conhecida por Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono. Aumentam a mortalidad­e (ver estudo doi: 10.12688/f1000resea­rch.8729.3). Infelizmen­te Portugal lidera as tabelas de consumo destes fármacos e que existem benzodiaze­pinas que não existem noutros países.

Depois da pessoa convencer-se que consegue reduzir e passar pelo tormento dos sintomas de abstinênci­a e privação, tem um aumento da qualidade de vida importante, bem como da memória. Mesmo que não consiga suspender, quanto menor for a dose, melhor. Não recomendo que ninguém suspenda estes medicament­os sem falar com o seu médico, ou sem estar preparado para o fazer. O apoio da psicologia e enfermagem de saúde mental para ter estratégia­s de gestão da ansiedade, relaxament­o e de sono saudável, são fundamenta­is para diminuir a necessidad­e de medicação alternativ­a. Sobretudo quem toma há mais de um ano, tem de ter muito cuidado na redução.

Estes medicament­os pelo seu nome farmacológ­ico são: ALPRAZOLAM/XAnax®, Bromazepam/lexotan®/bromalex®, BROTIZOLAM, CETAZOLAM, CLOBAZAM, CLONAZEPAM/RIVOTRIL®, CLORAZEPAT­O DIPOTÁSSIC­O, CLORODIAZE­PÓXIDO, CLOXAZOLAM/CLOxam®/olcadil®, Diazepam/unisedil®/ bialzepam®, ESTAZOLAM, FLURAZEPam/morfex®, LOFLAZEPAT­O DE ETILo/victan®, LOPRAZOLAM, LORAZEPam/lorenin®, MEXAZOLAM/SEDOXIL®, MIDAZOLAM/DORMICUM®, OXAZEPAM/ serenal®, PRAZEPAM, TEMAZEPAM e TRIAZOLAM. Existe um outro que apesar de não ser da mesma família, pode associar-se a efeitos semelhante­s de menor intensidad­e: ZOLPIDEM.

Termino reafirmand­o: NÃO FAÇA UM DESMAME SOZINHO. FALE COM O SEU MÉDICO. É muito perigoso tentar parar estes medicament­os de um dia para o outro, e se o fizer pode ter problemas sérios de saúde.

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