A dignidade presente em cada ruga (Parte II)
No último artigo tive a oportunidade de fazer uma introdução a diversos pontos positivos e negativos associados ao processo de envelhecimento. De facto, a tendência do envelhecimento é uma realidade regional, nacional e, até mesmo, internacional. Segundo os dados dos Censos 2021, existem cerca de 2.424.122 de pessoas com 65 anos ou mais e apenas 1.331.396 de pessoas com menos de 15 anos a residir em Portugal. O número de pessoas com 65 anos ou mais, aumentou 20,6% nos últimos 10 anos e, atualmente, representam 23,4% da população portuguesa. O grupo populacional que teve uma redução mais significativa foi o das pessoas até aos 15 anos de idade, que desceu 15,3% e representa hoje, 12,9% da população portuguesa. Como referido anteriormente, o índice de envelhecimento da população indica que existem 182 idosos por cada 100 jovens. Atendendo às projeções do Instituto Nacional de Estatística, em 2060, irão residir em Portugal cerca de 307 idosos por cada 100 jovens e, em 2080, a Madeira será a região mais envelhecida de Portugal, registando cerca de 409 idosos por cada 100 jovens.
Esta é uma realidade que deve ser tomada em consideração, com o intuito de encontrar soluções que sejam humanas e aceitáveis, de forma a garantir que o processo de envelhecimento seja positivo e ativo para a maioria da nossa população.
Parece oportuno colocar a seguinte questão: Os idosos são fardos, parasitas sociais ou pessoas não desejadas?
Em bom rigor, a imagem do idoso não alcança um consenso universal. Para alguns, o idoso será sempre visto como uma pessoa digna, sábia, que merece ser respeitada e que continua a desempenhar um papel importantíssimo no seio da sua família e da sociedade. Para outros, os idosos são pessoas incapazes, doentes e inúteis porque já não produzem como no passado, dependem de terceiros e são apontados como os maiores consumidores de cuidados de saúde, contribuindo de modo crescente para a escalada de custos. Este tipo de intolerância leva-nos ao idadismo, que pode ser entendido como atitudes e práticas negativas generalizadas em relação aos indivíduos baseadas na idade e que, naturalmente, atinge sobretudo as pessoas mais velhas.
O idadismo é uma forma de discriminação da terceira idade e deve ser combatida, caso contrário, estaremos a colocar em risco as medidas de promoção do envelhecimento ativo. O preconceito e os sentimentos negativos em relação aos mais velhos, podem, por vezes, surgir até mesmo em atitudes paternalistas, de zelo extremo ou excessivo, ao ponto de tratarem os idosos como crianças ou de não permitirem que seja o idoso a tomar as suas próprias decisões. O idadismo está presente nos lares quando estes aproximam-se mais de um depósito de velhos do que espaços de acolhimento; e, pode assumir comportamentos efetivos como maus-tratos e abusos. É fundamental identificar e limitar todas estas ideias idadistas que se encontram disseminadas na nossa sociedade e que têm um grande impacto negativo na autoimagem da pessoa idosa.
Nos termos do artigo 72.º da Constituição da República Portuguesa, as pessoas idosas têm o direito à segurança económica e a condições de habitação e convívio familiar e comunitário que respeitem a sua autonomia pessoal e evitem e superem o isolamento ou a marginalização social. A política de terceira idade engloba medidas de caráter económico, social e cultural tendentes e proporcionar às pessoas idosas oportunidades de realização pessoal, através de uma participação ativa na vida da comunidade. Porém, basta observarmos as notícias do nosso país para compreender que a sociedade ainda trata os idosos com alguma crueldade. Exemplo disso, é a tendência crescente do número de idosos que são vítimas de violência física, psicológica, sexual e financeira, que são abandonados nos hospitais e que se encontram sozinhos e isolados.
Afortunadamente, somos uma sociedade atenta, humana, informada e sensível, com vontade de trabalhar no sentido de proporcionar um bem-estar global aos nossos idosos. Ainda há muito por fazer. É importante encontrar respostas e soluções que, dentro da razoabilidade, respeitem a dignidade e o papel singular do idoso. Devemos criar estratégias para que os idosos sejam vistos como cidadãos importantes e úteis para a nossa sociedade, eliminando a imagem de inutilidade ou de fardo social. Sem esquecer que, a dignidade existe e não admite graduações, não conhece idades, condições, dificuldades ou características. Qualquer ser humano possui dignidade, só por existir.
Cândida Carvalho escreve à quinta-feira, de 4 em 4 semanas