Jornal Madeira

Primeira comunhão

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Era um ritual religioso levado muito a sério. Ansiava-se por esse dia. Simbolizav­a um salto qualitativ­o no percurso dum cristão na igreja católica.

Fazer a primeira comunhão era motivo de orgulho para quem a fazia, mas sobretudo para os pais.

Tudo era preparado ao pormenor. Praticamen­te quando entrávamos na escola primária, também começávamo­s na catequese. Era aí que nos preparavam para esse dia especial.

As aulas eram dadas por uma catequista. Em casa aprendíamo­s a rezar e a se benzer, mas era na catequese que se aprendiam outras coisas.

Éramos preparados para receber o “corpo de Cristo” simbolizad­o nas hóstias.

Ensinavam-nos a comungar.

Até porque antes disso apenas nos limitávamo-nos a olhar com algum espanto de admiração para os adultos a comungar. Olhávamos com desejo de também um dia o fazer. Não diria que fosse tanto pela fé, mas mais por curiosidad­e de criança.

Depois da primeira comunhão já estávamos por assim dizer de pleno direito dentro da religião católica.

Para além da preparação na Igreja, também havia a preparação lá em casa.

Era um dia especial.

Tínhamos de levar um fato a rigor. A cor branca era a predominan­te.

Naquele dia quando nos encontráva­mos - eu os meus colegas - no adro da igreja, dava para apreciar os mais variados de fatos que todos traziam. Uns de calça curta, outros de calça comprida e outros até de túnica parecida com a dos padres, mas de cor branca.

Em casa os fatos eram muito cuidados. Preparados com rigor. Por vezes alguns eram emprestado­s por vizinhos que tinham filhos mais velhos que já tinham passado por este ritual.

No meu caso como tinha vários irmãos, o mesmo fato ia passando de uns para os outros. De novo talvez apenas os sapatos brancos.

O fato era praticamen­te só usado naquele dia, depois era religiosam­ente guardado.

Posteriorm­ente só era usado em situações muitos especiais.

Lembro-me de ser requisitad­o para levar o “cesto” com as alianças nos casamentos. Normalment­e os “transporta­dores das alianças” eram os primeiros a entrar na igreja em direção ao altar. Era sempre um casal. Um menino e uma menina que entram de mão dada transporta­ndo um pequeno cesto carregado de flores com as alianças lá dentro.

Lembro-me de ter sido requisitad­o algumas vezes. Em bom rigor não me agradava muito. Sentia vergonha ao percorrer o centro da igreja em direção ao altar com pessoas por todo o lado.

Éramos preparados para receber o “corpo de Cristo” simbolizad­o nas hóstias.

Os casamentos também tinham um lado bom que era o da festa. Era dia de comida boa, com muitos doces e também com muita brincadeir­a.

Era uma das formas de dar uso ao fato da primeira comunhão.

Havia também outra. E essa por razões óbvias ainda mais chata que era a de acompanhar funerais. Isso também acontecia. Normalment­e algumas crianças com as vestes da primeira comunhão eram os primeiros na frente dos cortejos fúnebres. Uma tarefa ingrata mas que tinha de ser.

Gil Rosa escreve à quinta-feira, de 4 em 4 semanas

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