Processos no Tribunal de Família dispararam por causa da pandemia
Três associações organizam uma conferência sobre ‘Violência intrafamiliar’, que aumentou com a pandemia. Isabel Baptista, vice-presidente da APJD, e juiz no Tribunal de Família e Menores, diz que disparou o número de processos.
O conceito será mais lato do que ‘violência doméstica’, cujo flagelo nos remete para o interior de uma habitação, atinge mais as mulheres ou leva a pensar que é o sexo feminino o mais atingido. Mas, ‘violência intrafamiliar’ inclui vários tipos de abusos físicos e psicológicos entre os diferentes membros de uma família, atingindo as mulheres, os homens, as crianças e os idosos, não sendo necessariamente dentro de portas. O confinamento por causa da pandemia veio intensificar os conflitos entre os diferentes membros de um agregado familiar, com o aumento de processos na Justiça.
É, portanto, para debater a violência intrafamiliar - cujo conceito é tido no Código Penal português como ‘Violência Doméstica’ -, que surge a iniciativa conjunta entre o Núcleo Regional da Madeira do Movimento Democrático das Mulheres, a Associação Portuguesa de Juristas Democráticos (APJD) e a Associação Internacional dos Juristas Democratas (IADL), a ter lugar no dia 27 de maio, pelas 18 horas, na Assembleia Municipal do Funchal, com a participação de especialistas das áreas da Justiça, social e saúde.
Em declarações ao JM, a juiz Isabel Baptista, vice-presidente da Associação Portuguesa de Juristas Democráticos (constituída em 1977) e membro por inerência da IADL, explicou que a ideia de debater o tema surgiu, entre outras razões, do facto de o Tribunal de Família e Menores (de que faz parte) estar a receber nos últimos tempos mais questões relacionadas com violência entre os se
tiveram de regressar a casa dos pais, onde não havia dinheiro para deixar os pais nos lares e os centros de dia estavam fechados”, num retrato regional de inúmeros madeirenses a viverem da assistência social.
“Dispararam” também os números de processos tutelares educativos bem como os processos de promoção e proteção dos menores, por causa do confinamento que “potenciou a chamada violência doméstica”.
A par desses, a vice-presidente da APJD considerou que terá também se terá agravado a violência sobre as pessoas com deficiência e nas famílias de estratos sociais da classe média-alta, mais difíceis de detetar.
A outro nível, a jurista explicou que “a violência doméstica é um termo que poderá significar violência dentro de casa, e a intrafamiliar é entre os seres da mesma família. É um conceito que na nossa legislação é entendido como sinónimo, mas que no imaginário do povo, a violência doméstica só acontece às mulheres e, por isso, é muito difícil os homens que são vítimas de violência doméstica entenderem que têm o direito de apresentarem queixa”, expôs.
Assim, no seu entender, em termos legais, apesar de não estar assumido, “a violência intrafamiliar faz mais sentido como termo natural porque a violência tal como outras formas de abuso pode ser cometida à distância”. Até porque, “nesta capa da violência doméstica, no conceito popular, a mulher é a agredida, não inclui a violência sobre os velhos, sobre as crianças, sobre os homens”, podendo até ser minimizada por não ser sempre física, mas sim verbal, psicológica ou comportamental.
Dos exemplos que dava na entrevista ao JM sobre formas de violência que também carecem de atenção dos diferentes especialistas da sociedade é o abandono dos idosos. “A sujeição ao abandono pelos filhos, apesar de poderem nos colocar num bom lar, mas não aparecem mais, é uma forma de violência que não está prevista na lei. Será, contudo, uma das violências mais terríveis, que é a solidão dos idosos”.
Nesta capa da violência doméstica, no conceito popular, a mulher é a agredida, não inclui a violência sobre os velhos, sobre as crianças, sobre os homens.