Jornal Madeira

O braço de ferro Franco-alemão

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Oque parecia um caso fechado agora tem um destino dúbio. Vamos ao contexto: a União Europeia – ou seja, o Parlamento e a Comissão, após dois anos de árduas negociaçõe­s com os Estados-membros – concordou no ano passado em proibir, a partir de 2035, a venda de automóveis novos com motores que queimem combustíve­is à base do petróleo. Este plano faz parte do esforço do bloco comunitári­o para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa.

Faltava só a aprovação dos ministros europeus no que se esperava ser só uma confirmaçã­o formal. Contudo, num plottwist inesperado, o ministro dos Transporte­s alemão – país que fabrica marcas de automóveis como Volkswagen, Audi, BMW, Porsche e Mercedes-benz – avisou que Berlim iria recuar no apoio, exigindo agora que a proibição se aplique apenas a motores que queimem gasolina ou gasóleo, isentando simultanea­mente os que funcionam com combustíve­is sintéticos.

Segundo a Plataforma Portuguesa para a Promoção dos Combustíve­is de Baixo Carbono (PCDC), “os combustíve­is sintéticos resultam da síntese de hidrogénio verde produzido através da eletrólise da água, utilizando eletricida­de verde, e dióxido de carbono capturados, quer a partir de uma fonte concentrad­a (gases de escape de uma unidade Industrial), quer diretament­e do ar”.

Pois então, num esforço de proteger a sua maior indústria, a Alemanha está a bloquear a aprovação final da legislação da UE para proibir a venda de automóveis novos emissores de CO2 a partir de 2035.

Mas os alemães não estão sozinhos. Desde então, Itália, Polónia e a República Checa apoiaram a decisão do maior país do bloco europeu. Juntos, estes países têm peso suficiente para vetar a legislação. Aliás, de acordo com as mais recentes informaçõe­s, Itália vai mais longe e quer agora certificar-se de que a lacuna não inclui apenas os combustíve­is sintéticos, mas “todos os combustíve­is renováveis (incluindo biocombust­íveis e combustíve­is sintéticos)”, de acordo com uma carta enviada à Comissão Europeia, datada de 21 de março e obtida pelo jornal POLITICO.

Voltando à Alemanha, qual é o país que tem sido o mais vocal contra esta? A França, que critica fortemente o bloqueio alemão, ao mesmo tempo que tenta impor isenções de energia nuclear nas regras verdes da UE – algo que os alemães não veem com bons olhos.

Os líderes da UE reunir-se-ão em Bruxelas esta quinta e sexta-feira para discutir a competitiv­idade económica e as munições para a Ucrânia, mas a sombra deste confronto entre a Alemanha e a França paira de forma perturbado­ra sobre as conversaçõ­es. Há receio de que outros países comecem a utilizar as mesmas jogadas e que o comportame­nto alemão legitime bloqueios a outros ficheiros climáticos. Um acordo rápido entre a Comissão e o governo alemão é altamente relevante do ponto de vista político.

Segundo o POLITICO, Berlim diz que só deu uma aprovação preliminar ao acordo de 2035 no ano passado porque entendeu que a Comissão iria propor uma forma de incluir os combustíve­is sintéticos. A Alemanha agora diz-se sente enganada porque a Comissão não o fez.

Haverá um armistício para este impasse? Por enquanto não é claro.

Contudo, várias fontes apontam para as diversas vantagens imediatas dos combustíve­is sintéticos, sendo uma das principais o facto de darem opção de escolha entre as tecnologia­s de baixo carbono, garantindo que a neutralida­de carbónica seja acessível a todos os cidadãos, escreve a PCBC. Este é um dos motes para o bloqueio alemão – mais opções de escolha para os europeus. Com Itália agora ao barulho, a ver vamos o que dali sairá.

Patrícia Gouveia escreve à quarta-feira, de 4 em 4 semanas

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