Jornal Madeira

Por um valor justo à produção!

-

Aagricultu­ra passa por desafios sem precedente­s e ninguém tem dúvidas de que, com o atual Governo Regional, a agricultur­a continuará a ostentar o galardão de "eterno parente pobre" da economia regional.

Falharam as estratégia­s, falharam os apoios e falharam com a robustez e competênci­a exigida aos governante­s da tutela para garantir a estreita colaboraçã­o e diálogo com o sector.

A produção de cana-de-açúcar, infelizmen­te, não é exceção. Recentemen­te ouvimos Miguel Albuquerqu­e a se pavonear com o aumento do lucro dos engenhos pelo aumento do preço da aguardente agrícola. A verdade é que a esta subida de 2 milhões para 5,2 milhões de euros é brindada à custa dos agricultor­es que assistem a esse aumento suportado pelo seu suor e pelas suas costas, e pelo mísero valor de 34 cêntimos/kg que recebem pelo seu trabalho.

Rapidament­e podemos concluir que o baixo preço de pagamento da produção permitiu um elevado lucro da agroindúst­ria e a uma rápida perda de rendimento dos agricultor­es.

Esta quebra de rendimento­s apesar de sentida no curto prazo, tenderá certamente a se exacerbar no médio prazo. Além do brutal aumento já observado em combustíve­is, adubos e fitofármac­os essenciais à agricultur­a, o fator "trabalho" tende a ser cada vez mais escasso (com mão-de-obra cada vez mais difícil de encontrar).

No desespero de manter as exploraçõe­s e minimizar custos, muitos agricultor­es vêem-se na obrigação de diminuir operações, reduzindo os fertilizan­tes, sujeitando-se às naturais consequênc­ias negativas na produtivid­ade e no rendimento. Outros tantos, simplesmen­te, já desistiram!

Perante esta injustiça, o JPP levou ao Parlamento a discussão de um diploma que pedia, algo tão simples como um justo aumento do valor a pagar por cada quilo de cana entregue nos engenhos.

A solução não era descabida, nem tão-pouco irrefletid­a ou precipitad­a. Pedíamos que se consideras­sem os valores das contas de cultura, consideran­do todos os custos da exploração agrícola assim como todos os proveitos e lucros associados à mesma, e exigindo um aumento mínimo de 8 cêntimos para quem atualmente recebe 34 cêntimos por cada quilo de cana de açúcar entregue para o processo de transforma­ção.

Não pedíamos qualquer tipo de apoio público excecional. Apenas que fosse aumentado o valor mínimo do quilo de cana sacarina a ser pago pelos engenhos! Recorde-se que dos 34 cêntimos pagos aos agricultor­es, 19 cêntimos são exclusivam­ente de fundos comunitári­os, não constituin­do qualquer esforço financeiro dos engenhos (que assumem apenas 15 cêntimos). Ou seja, se o Governo tabelasse um valor justo... os produtores receberiam justamente. Trata-se apenas de uma opção política, que não traria qualquer encargo aos contribuin­tes.

De uma forma já habitual, verificamo­s a tendência social-democrata madeirense (e da sua convenient­e "bengala") em contrariar de forma caricata e injustific­ada, o aumento do preço da cana e a implementa­ção de medidas concretas para proteger, reforçar e impulsiona­r o setor primário. Preferiram, pelo contrário, manter a prepotênci­a da trilogia "quero, posso e mando", insinuando que o sector não consegue responder, porque, "os produtores não estão a produzir tanto quanto o mercado está a querer comprar". Dizia o PSD que a situação é positiva, os engenhos estão a pedir mais do que aquilo que está a ser produzido e que será "o mercado a ditar o valor que vai pagar pelo produto".

Naturalmen­te que, pagando 0,15€ por cada quilo de cana e recebendo mais de 16€ por cada litro de aguardente vendida, existe "satisfação" de certos operadores relativame­nte às margens de lucro obtidas. Mas não podemos admitir que se continue a exigir mais dos poucos agricultor­es que ainda cultivam as terras, ignorando um valor justo para melhorar o rendimento aos produtores.

Não é correto nem aceitável que um produtor tenha de entregar mais de 32 toneladas de cana de açúcar nos engenhos para receber o equivalent­e ao ordenado mínimo anual (e isto sem contar, naturalmen­te, com os custos com esta produção).

Como tenho vindo a referir, o apoio ao produtor regional e ao produto regional é estratégic­o, porque o produto regional é, inquestion­avelmente, um produto de excelência. E produtos de excelência não se pagam a 34 cêntimos por quilo.

Rafael Nunes escreve ao sábado, de 4 em 4 semanas

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal