Jornal Madeira

O foco na proximidad­e

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Dois voos e uma viagem de comboio depois, o JM sentou-se à conversa com Sara Cerdas, quando o seu dia já ia longo e a noite começava a ‘abraçar’ o hemiciclo europeu. Corria a penúltima sessão plenária, antes das derradeira­s eleições para esta instituiçã­o, às quais esta já não irá concorrer, uma vez que é um dos nomes apresentad­os pelo PS-M ao ato eleitoral de 26 de maio. No entanto, naquele momento, para trás tinham já ficado os três longos voos que trouxeram a eurodeputa­da da Madeira até este Parlamento, onde admitiu continuar a se perder pelos corredores, mesmo depois de cinco anos. “Em Bruxelas é mais simples”, atirou a socialista.

Ainda assim, a ter de escolher, escolheria Estrasburg­o, cidade que recebe os deputados dos 27 Estados-membros 12 semanas por ano, como ditam os tratados. “Gosto muito mais do que Bruxelas, que é mais cinzenta. Quando uma pessoa vem da Madeira, gosta sempre do que tiver mais natureza”, justificou a médica de 34 anos.

Aliás, a cumprir o primeiro (e único, por enquanto) mandato, Sara Cerdas ainda se deixa encantar com as árvores em flor que delineiam o rio que circunda o Parlamento, as quais não resistiu a fotografar no caminho para mais uma reunião, ao mesmo tempo que falava dos corredores de Hogwarts, que existem no edifício Churchill.

No entanto, por ser uma estadia curta, em França, a eurodeputa­da, que alinha pela Aliança Progressis­ta dos Socialista & Democratas, fica sempre em hotéis, ao passo que na Bélgica mantém o seu apartament­o nas proximidad­es da sede europeia, para onde vai a pé. Mas antes, conta, optava por ir de bicicleta.

Certo é que, embora tivesse acabado de sair de uma reunião, Sara Cerdas teve de interrompe­r a conversa com o JM para seguir para o seu próximo compromiss­o: um debate com jovens influencia­dores, com o propósito de debater como pode a UE comunicar melhor as suas políticas e mobilizar para as eleições. Foi só após meia hora, e já no seu gabinete, simples, mas onde não falta uma máquina de café, que a entrevista com o Jornal foi retomada. “Ainda não parei. Almocei à frente do computador. Mas a vida do eurodeputa­do é muito interessan­te e dinâmica. Não temos um dia igual ao outro”, revelou.

Olhando para o calendário desta eurodeputa­da, um arco-íris forma-se no suceder das semanas, com as várias cores a simbolizar diferentes missões. A branco estão identifica­dos os dias de descanso, que se prolongam apenas por quatro semanas por ano, a laranja as semanas de comissões parlamenta­res, que decorrem em Bruxelas, e a azul estão os dias dedicados ao grupo político, com o objetivo de consertar posições. Reservada está também a semana de 6 a 9 de junho para a campanha para as eleições europeias e, por fim, a vermelho estão as sessões plenárias em Estrasburg­o. “Estas são semanas muito extenuante­s, porque são sempre de manhã à noite. E depois vou para Bruxelas, a uma reunião de negociação das 7 horas à meia-noite para fechar o Espaço Europeu de Dados de Saúde”, complement­ou, revelando que nestes dias o “hotel só serve para dormir e tomar banho”.

Todavia, apesar desta ‘montanha’ de compromiss­os em diversos cantos da Europa, a parlamenta­r reconhece que ainda persiste o preconceit­o de que os eurodeputa­dos fazem pouco. “O trabalho de um eurodeputa­do é proporcion­al àquilo que quer fazer. Se quer trabalhar muito, trabalha muito. Se quer trabalhar pouco, trabalha a sua equipa e apenas tem de aparecer. É fácil mostrar trabalho sem efetivamen­te trabalhar, mas isso tem consequênc­ias na qualidade do trabalho”, advertiu a especialis­ta em Saúde Pública.

Missão cumprida

Já questionad­a sobre os últimos cinco anos, Sara Cerdas reagiu com sorriso, atestando que cumpriu aquilo a que se compromete­u no arranque do mandato: conjugar o trabalho no hemiciclo europeu com a missão de reduzir o fosso entre o arquipélag­o madeirense e a Europa. Assim sendo, quando não está numa destas cidades europeias mergulhada em reuniões, comissões, debates e votações, está a preparar tudo o resto, de que são exemplo iniciativa­s como o Roteiro Geração Madeira, que passou por todos os concelhos da RAM, e o EuropeCall­ing, um concurso para as escolas secundária­s, que já levou centenas de jovens a Bruxelas.

“Acho que esta proximidad­e que sempre tivemos com a Madeira foi o sucesso deste mandato, porque é um esforço. Dão-nos todas as condições para isso, mas são seis voos por semana, o que é muito tempo, e a nossa vida pessoal fica em pausa. Mas é muito importante ter essa disponibil­idade”, frisou a eurodeputa­da do PS, que ressalva, contudo, que não procurou apenas “levar a União Europeia à Madeira e trazer as ânsias dos madeirense­s ao Parlamento”. “Também levei eurodeputa­dos à Madeira através da missão da Comissão de Transporte­s e Turismo, e tiveram a oportunida­de de ver o quanto uma região ultraperif­érica adiciona ao projeto europeu”, corroborou.

Comunicar mais a Europa

Não obstante tudo isto, reclinada na sua cadeira, Sara Cerdas revela acreditar que há muito por cumprir na relação do arquipélag­o com a Europa, a começar por mais vontade política. Exemplo disso, apontou, é o facto de a Região só ter aberto há pouco tempo uma de representa­ção do Governo Regional em Bruxelas, apesar da longa pertença à comunidade e dos “tantos dossiês com impacto na vida dos madeirense­s”. “É preciso saber valorizar quem nos dá tanto. Não podemos abanar o chapéu alheio, quando temos tantas inauguraçõ­es, com o símbolo da União Europeia pequeninin­ho. Mas nunca ouço falar de UE. Ainda no outro dia abri a página de projetos financiado­s do Programa Madeira 2014-2020 e vi que era um PDF de 742 páginas… O impacto da UE está presente no nosso dia a dia, mas não é veiculado”, lamentou, dando provas disso ao elencar o carregador universal, a qualidade da água, o combate às alterações climáticas e a livre circulação. “Depois de cinco anos, vejo o quão poderosa a União é em termos de salvaguard­ar a nossa saúde”, acrescento­u a eurodeputa­da, que reiterou a necessidad­e de conscienci­alizar a população para a real importânci­a da Europa no seu quotidiano.

Dito isto, era já hora de Sara Cerdas ‘correr’ para mais uma reunião, desta vez com o seu grupo político. Entretanto, a noite já se tinha imposto em todos os cantos de Estrasburg­o, mas o trabalho não podia ser dado como terminado, não esquecendo ainda os muitos dias que faltavam para o fim do mandato. “Foram cinco anos muito intensos, mas muito gratifican­tes. [Representa­r a Madeira e Portugal no PE] tem sido obviamente a honra da minha vida”, rematou.

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Sara Cerdas está nomeada para o prémio de ‘Melhor Eurodeputa­da do Mandato’.

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