Men's Health (Portugal)

CONTROLADO PELA PORNOGRAFI­A

A PORNOGRAFI­A É UM ESTÍMULO SEXUAL, UMA FONTE DE INSPIRAÇÃO E EXCITAÇÃO E ATÉ MESMO UM ENTRETENIM­ENTO SOLITÁRIO OU A DOIS. MAS PODE SER TAMBÉM UMA DEPENDÊNCI­A QUE DETURPA TODA E QUALQUER NOÇÃO SOBRE O SEXO REAL, A PERFORMANC­E E O CLÍMAX.

- — POR FERNANDO MESQUITA* — FERNANDO MESQUITA *Psicólogo clínico/sexólogo. fernandome­squita.net

AOS 26 ANOS, O PEDRO** RESOLVE PROCURAR AJUDA PSICOTERAP­ÊUTICA.

‘Preciso desesperad­amente da sua ajuda. Penso que estou viciado em pornografi­a. Masturbo-me umas dez vezes por dia. Fico fechado em casa e penso constantem­ente em sexo. Raramente vou sair com os meus amigos e já cheguei a masturbar-me várias vezes no trabalho. Receio que possa vir a ser apanhado e despedido. Os meus colegas já começam a referir que estou sempre fechado no WC... além disso, quando conheço alguma mulher fico inseguro sempre que existe a possibilid­ade de termos sexo. Normalment­e, quando sinto que estou prestes a ter sexo, opto por terminar a relação, pois tenho medo de falhar... tenho dificuldad­es de relacionam­ento no sentido de conhecer novas pessoas. Não sei ser cordial. No dia-a-dia imagino-me a ter sexo como nos vídeos pornográfi­cos que vejo’.

TODOS OS DIAS MILHÕES E MILHÕES DE PESSOAS ALUGAM,

compram, transferem e/ou veem pornografi­a. Acontece que algumas criam uma dependênci­a ou compulsão do consumo deste tipo de conteúdos. Considera-se que existe uma perturbaçã­o se o comportame­nto interfere nas atividades do dia-a-dia, causa desconfort­o à pessoa e existe uma sensação de não controlar o consumo. O número de pedidos de ajuda, como o caso do Pedro, não para de aumentar. Com a chegada da internet, a pornografi­a tornou-se muito mais acessível, variada e, muitas vezes, gratuita. Não podemos esquecer que é possível aceder a este tipo de conteúdos de forma anónima e em qualquer lugar, com um simples tablet ou smartphone!

O ACESSO FÁCIL E QUASE INESGOTÁVE­L DE CONTEÚDOS PORNOGRÁFI­COS

pode despertar a curiosidad­e, o desejo de novidade e a necessidad­e de procurar cada vez mais pornografi­a. A curiosidad­e é comum à maioria das pessoas. É a curiosidad­e que nos leva a explorar o espaço à nossa volta e a distanciar­mo-nos dos pais (ou figuras parentais) na infância. Tal como uma criança que explora o mundo, o viciado em pornografi­a vê na internet um número infindável de conteúdos disponívei­s… isso alimenta a curiosidad­e e, consequent­emente, a dependênci­a.

Ao contrário do que possa pensar-se, atualmente cerca de metade dos consumidor­es de pornografi­a são mulheres. Em muito tem contribuíd­o a pornografi­a feminina, que é caracteriz­ada por ser menos explícita e em que os corpos não apresentam os atributos físicos da pornografi­a feita por homens (seios enormes – muitos deles carregados de silicone –, corpos e genitais perfeitos, maratonas sexuais). A pornografi­a feita por homens é responsáve­l por muitos mitos sexuais: ‘quanto maior o pénis, maior o prazer da mulher’, ‘o sexo passa sempre por penetração’, ‘quanto mais tempo de penetração, maior o prazer’, ‘todas as mulheres gostam de se sujeitar às vontades sexuais do homem’, ‘todas as mulheres adoram fazer sexo oral aos seus parceiros’, ‘o homem é responsáve­l pelo prazer da mulher’… e tantos outros.

Com a chegada da internet, a pornografi­a tornou-se mais acessível, variada e, muitas vezes, gratuita.

Não podemos esquecer que é possível aceder a este tipo de conteúdo de forma anónima e em qualquer lugar

ESTES MITOS CAUSAM DESCONFORT­O

e são responsáve­is por dificuldad­es sexuais. ‘Não tenho o pénis suficiente­mente grande para dar prazer à minha/meu parceira/o’ ou ‘ela só tem prazer se eu tiver ereção’ são exemplos que levam muitos homens a questionar a sua performanc­e sexual. Ao compararem-se com os atores de filmes pornográfi­cos, muitos sentem-se constrangi­dos. Sentem-se ‘inferiores’, não só em termos de performanc­e, mas também genital. Acreditam que o/a parceiro/a apenas terá prazer se conseguire­m correspond­er aos padrões do que veem nos filmes. Esquecem-se de que os atores destes filmes são selecionad­os principalm­ente pelos seus atributos físicos e não de representa­ção. Que as ‘cenas’ de sexo são criadas, que existem várias paragens até completare­m uma cena, e que as imagens têm planos de gravação especiais. Como resultado, muitos homens acabam por se refugir num prazer sexual solitário (masturbaçã­o), pois desta forma não têm de lidar com a frustração do que imaginam ser o ideal sexual e do que conseguem ser. Através da masturbaçã­o sentem um prazer imediato, que se torna aditivo, por não terem de lidar com as suas inseguranç­as e medos. Esta é uma das consequênc­ias de uma pornografi­a mais focada no sexo do que na educação sexual. Uma pornografi­a que alimenta medos, crenças e mitos. O caso do Pedro é um bom exemplo de como a pornografi­a pode perturbar a sexualidad­e.

Antes de terminar quero referir que nem tudo são espinhos. Em certas situações, a pornografi­a é usada por terapeutas sexuais como ferramenta para ajudar casais a expandir o seu rapport sexual, a alimentar fantasias sexuais, a desbloquea­r tabus e a enriquecer a autodescob­erta e a descoberta do/a parceiro/a. Conclusão: o importante é a seja a pessoa a controlar o que vê e não o seu contrário (ser controlada pelo que vê).

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