O QUEBRAR DE UM VELHO ESTIGMA
Manifestações ano-rectais de doenças sexualmente transmissíveis
APESAR DAS CAMPANHAS despoletadas pela SIDA que começaram a ter maior projeção nos anos 80, as doenças transmitidas por contacto sexual (DST) continuam a ser um grave problema de saúde pública. Segundo dados da OMS, estima-se que os novos casos por ano ultrapassem os 250 milhões e que mais de 1000 milhões de pessoas sejam afetadas por uma ou mais das várias doenças sexualmente transmissíveis. Em Portugal a situação também é preocupante, principalmente na população mais jovem, estimando-se em 3% a prevalência das DST na população portuguesa. Podendo ser causadas por micro-organismos tão diversos como bactérias (gonorreia), até vírus como o HPV, passando ainda por outros tipos de micro-organismos como o treponema (responsável pela sífilis), este grupo de doenças tem em comum ser invariavelmente originado por contatos sexuais por via vaginal, oral ou anal. O risco de contágio é tanto maior quanto mais frequente for a ocorrência de atividade sexual desprotegida e com múltiplos parceiros. Estas doenças podem manifestar-se de forma muito diversa ou, e ainda mais perigoso, evoluir sem dar quaisquer sinais e apenas serem detetadas em fases muito tardias. Para além dos efeitos diretos, podem complicar-se com o aparecimento de outras situações clínicas mais graves incluindo as do foro neurológico ou cardiovascular - como acontece com a sífilis - ou oncológico que ocorre no decurso das infeções por HPV. As DST com localização no reto e ânus são, na sua grande maioria, causadas por contactos sexuais por via anal embora também possam, mais raramente, ser consequência de infeção por continuidade tendo como ponto de origem a região genital, ou resultado da utilização de brinquedos sexuais contaminados. Os sintomas que fazem suspeitar a presença deste tipo de doenças são diversos e muitas vezes, por falta de informação, são pouco valorizados ou erradamente atribuídos pelos doentes a outros problemas anais, tais como as hemorróidas. Por outro lado, mesmo que existam queixas mais exuberantes, a vergonha e o constrangimento por vezes associados a uma enorme carga de preconceito social, fazem com que se protele a ida ao médico implicando que o diagnóstico seja efetuado em fases tardias e mais difíceis de tratar. Não é raro, por exemplo, que uma infeção causada por HPV (vírus do papiloma humano) seja arrastada por muito tempo, constatando-se na altura em que o diagnóstico é efetuado a presença de alterações importantes tais como o cancro do canal anal. Assim, a observação por um especialista com execução de um cuidadoso exame proctológico é sempre obrigatória em homens ou mulheres com sintomas tais como: prurido ou dor anal persistente, hemorragia, saída de pus ou muco pelo ânus, aparecimento de úlceras ou qualquer outro tipo de lesões. O diagnóstico destas doenças pode ser efetuado de imediato através da observação, ou após a execução de diversos exames a partir de amostra de exsudado ou células colhidas durante o exame proctológico. Tendo em conta a diversidade de agentes causadores destas doenças o tratamento é muito variado quer no tipo quer no grau de complexidade. Desde a simples utilização de antibióticos até à necessidade de cirurgia, o espectro de atitudes terapêuticas é extremamente diversificado e varia de doença para doença. Escusado será dizer que, mais importante que tratar, a prioridade está na prevenção. Saliente-se ainda a necessidade imperiosa de uma observação médica perante sintomas que poderão apontar para a existência de uma DST. O autodiagnóstico através dos motores de busca disponíveis é quase sempre errado e não substitui a opinião de um profissional de saúde.