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BILROS: AS ARTISTAS DOS FIOS

As rendas de bilros são uma arte que passa de mão em mão, de mães para filhas. Há escolas que ensinam a técnica e museus que preservam memórias. Vila do Conde tem o maior exemplar do mundo. Peniche organiza uma mostra internacio­nal e burila a ideia de uma

- Sara Dias Oliveira

Em 2018, fala-se da renda de bilros por muitas razões. A jornalista Sara Dias Oliveira revela quem a ensina em Vila do Conde e quem lhe dá novos usos a partir de Peniche. No caminho, cruzou-se com uma artista portuense que depositou um grande coração rendado em Tóquio.

Alice Veiga sente-se uma artista. Almofada no colo, fios de linho enrolados nos bilros, olhos num desenho picotado, mãos que não param. “A renda não é toda igual. Há uma aprendizag­em, ensinam-nos os segredos, como passar dos motivos para o fundo e do fundo para os motivos. Não se faz da mesma maneira, mas o resultado é o mesmo”, explica sem parar o trabalho. “Temos de criar e é por isso que digo que somos artistas”, acrescenta. Aos cinco anos, Alice, nascida e criada em Vila do Conde, estava a aprender rendas de bilros. “Não íamos logo para a almofada, íamos encher os bilros e fazíamos lapão, uma renda pequenina com 18 bilros”, recorda. A vida deu várias voltas, andou por outros trabalhos, e há 17 anos voltou a entrar no Museu das Rendas de Bilros de Vila de Conde, um solar do século XVIII. Desde então é uma das rendilheir­as da oficina do museu. De segunda a sexta, mostra que a base das rendas de bilros está no cruzamento e no torcer dos fios. “Isto é uma arte e quando a renda está pronta até parece que sentimos pena, afinal é uma criação.” Goreti Sousa também é uma das rendilheir­as seniores. Adora as rendas populares mais antigas que não consegue replicar. A renda que lhe anda no colo há mais de um mês está quase pronta. Goreti prefere as linhas mais finas para esta renda que exige minúcia. Um erro e é preciso desfazer para refazer. Uma trabalheir­a, mas também uma alegria. “Uma rendilheir­a nunca está triste. É mesmo viciante, é relaxante, é uma terapia”, diz sem dar sossego aos bilros. No primeiro andar do museu funciona a escola de rendas todo o ano, gratuitame­nte. Lara Monteiro, nove anos, já aprendeu a descodific­ar o desenho e faz uma renda mais simples, o lapão. “Sempre quis fazer”, confessa. Sofia Moreira, 12 anos, está concentrad­a na renda que começou a fazer há mês e meio. São 37 bilros para manusear, fios que cruzam e torcem. É complicado? “Depois de apanhar o jeito, não”, responde. Inês Salazar, um ano mais velha, tem 54 bilros para mexer, começou a aprender nas férias de Natal, voltou agora à escola de bilros. Está focada no trabalho, na sua almofada de palha, e gosta de ver os desenhos que vão sendo transforma­dos em renda. Inês está curiosa. “Para ver como vai ficar.”

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REINALDO RODRIGUES/GLOBAL IMAGENS
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