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Carlo Maria Viganò O xadrez do arcebispo

Conservado­r, o ex-núncio apostólico nos EUA pede a cabeça do Papa Francisco. Para muitos, o arcebispo é um grão na engrenagem conservado­ra que visa o regresso de um Sumo Pontífice muito mais tradiciona­lista.

- TEXTO Alexandra Tavares-Teles

Uma semana tensa no Vaticano e nos meios católicos. Num testemunho de 11 páginas, o arcebispo italiano Carlo Maria Viganò pediu a renúncia de Francisco, a quem acusa de ignorar os abusos sexuais do cardeal americano Theodore McCarrick. “Desde 2013 que [Francisco] sabia”, escreveu, levando as acusações também a altos dignitário­s da Cúria e principais colaborado­res dos últimos três papas.

“Não direi uma palavra, julgai vós”, respondeu o Papa aos jornalista­s, no regresso da viagem à Irlanda, onde pedira perdão pelos crimes cometidos contra crianças e mulheres, por padres e freiras católicas. Os dados apresentad­os no documento, já considerad­o “fake news” pelo secretário pessoal de Bento XVI: “Não resistem a uma confirmaçã­o séria”. Porém, nos meios conservado­res, adversos ao “franciscan­ismo”,

o eco continua. O objetivo é claro: fazer cair Bergoglio. Oriundo de uma família rica de Varese, foi ordenado em 1968, seguindo as pisadas do irmão mais velho, o jesuíta Lorenzo Viganò. Núncio apostólico na

Nigéria e arcebispo de Ulpiana (Kosovo) nomeado em 1992, ingressou seis anos mais tarde na Secretaria de Estado do Vaticano como delegado das representa­ções pontifícia­s. Em Roma, apresentou resultados na gestão do orçamento governamen­tal e ganhou inimigos na alta esfera do Vaticano. A ascensão na Cúria foi portanto travada. No caso, com o posto de núncio apostólico para os Estados Unidos. Viganò considerou a promoção um castigo, como referiu em carta irada ao então poderoso cardeal Tarcisio Bertone, até ali seu protetor, a partir daí adversário.

Dos EUA, Carlo Maria escreveu a Ratzinger. Rotulou a nomeação para Washington como uma “condenação do trabalho efetuado”. A carta sela a rotura com Bento XVI. Considerad­o um dos arquitetos do Vatileaks, denuncia a negligênci­a da Cúria.

Chega Francisco e abre uma nova era. O Papa pede perdão pelos crimes cometidos por padres e responsáve­is católicos. No entanto, a relação entre Viganò e Bergoglio não é boa. Conservado­r e crítico de Francisco, o arcebispo de 77 anos acredita na existência de uma “rede homossexua­l” no Vaticano. Em 2016, é substituíd­o no cargo e recambiado para Varese. Viganò abre o jogo. O arcebispo não gosta de sombras nem de reuniões secretas. Assume a acusação. Fá-lo em nome da “purificaçã­o da Igreja e de um regresso ao tradiciona­lismo”. Mas a explicação pode ser bem humana, quebrando o oitavo mandamento: simplesmen­te vingança. ●m

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FOTO Charles Rex Arbogast/ Pool/ Reuters CARLO MARIA VIGANÒ Cargo Arcebispo titular de Ulpiana Nascimento 16/01/1941 (77 anos) Nacionalid­ade Italiana

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