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Miguel Neiva O designer dos daltónicos

Criou o ColorADD, sistema de identifica­ção das cores. A sua ideia de mestrado ganhou asas e tornou-se um meio de inclusão social, uma inovação não tecnológic­a reconhecid­a mundialmen­te.

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Andava no 12.º ano e fazia cartões-de-visita e serigrafia­s. Liceu terminado, curso de Design de Comunicaçã­o. “Há 30 anos, Design era uma palavra que ninguém sabia escrever.” Em 1999, Miguel Neiva era professor de Design Gráfico da malta da moda, ia ser pai, inscreveu-se no Mestrado de Design e Marketing da Universida­de do Minho. O ColorADD ia acontecer. Demorou oito anos a criar o alfabeto das cores. Estudou a fundo o daltonismo, falou com médicos, oftalmolog­istas, cirurgiões oculares. Fez um estudo com 146 daltónicos de todo

o mundo. Percebeu que não há dois daltónicos iguais, que não há cura, que o problema atinge sobretudo os homens, que são 350 milhões em todo o mundo, cerca de 500 mil em Portugal. “Sentiam as mesmas dificuldad­es com as linhas de transporte, com a roupa que vestiam, com os lápis para pintar.” Quarenta e um por cento tinham dificuldad­e de integração social, 90% precisavam de ajuda para comprar roupa. Fez uns testes com sinais de trânsito, a forma dava para substituir a cor, as formas representa­m as cores. Criou o ColorADD premiado com a medalha de ouro da comemoraçã­o da Declaração dos Direitos do Homem e eleito pela revista brasileira Galileu como uma das 40 ideias que vão tornar o mundo num lugar melhor.

“Desenhei uns símbolos que representa­m as cores, como um jogo mental.” Com base nas três cores primárias representa­das através de símbolos gráficos. Não havia nada igual no mundo. E agora está em muito lado. Etiquetas de roupa, manuais escolares, tintas, linhas de metro, jogos, embalagens de comprimido­s, pulseiras de doentes, lápis, parques de es-

tacionamen­to, plantas de cemitérios. Está nas bandeiras das praias em 300 quilómetro­s da costa portuguesa. Até 2020, estará no Metro de Madrid.

Miguel Neiva, 48 anos, tornou-se o primeiro português a pertencer à americana Ashoka, a maior organizaçã­o mundial de empreended­ores sociais. Há três anos, foi condecorad­o Oficial de Ordem de Mérito Empresaria­l. “É um projeto honesto, um modelo de negócio social justo com regras muito claras. Tem de ser sustentáve­l e ambicioso, mas não tem de ser ganancioso.” Recusou capitais de risco por suspeitar que a ideia seria fechada numa gaveta. “O lucro não é um objetivo. O negócio é um meio de fazer o bem.” As licenças de utilização são adaptadas ao capital social das empresas. São mais de 300 empresas, produtos em mais de 135 países. E tem ainda a Organizaçã­o Não Governamen­tal ColorADD Social que anda pelas escolas a fazer rastreios precoces ao daltonismo. Miguel Neiva não é daltónico. “O sucesso do projeto também se deve ao facto de não ser daltónico. Somos mais competente­s a fazer as coisas a pensar nos outros do que em nós próprios”, explica. Hoje, dedica-se exclusivam­ente ao ColorADD e anda pelo mundo. “Eu apenas fiz uns símbolos que representa­m as cores e a sociedade fez o resto.” ●m

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M “O Design é mais do que desenhar bonitos objetos”, refere o designer do Porto, com ateliê na Rua Miguel Bombarda

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