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AS CONSERVAS NÃO SÃO CONSERVADORAS
Nos últimos anos, ganharam prestígio à boleia do turismo. Várias empresas portuguesas apostam nos sabores diferenciados e inovam no design.
A indústria conserveira está de pedra e cal na tradição e na economia portuguesas. As fábricas, de Norte a Sul e nas ilhas, empregam mais de três milhares de pessoas. As conservas já atravessaram o declínio das receitas e ganharam nova vida com o turismo. Com os palatos mais apurados dos portugueses, a necessidade aguçou o engenho. Hoje, os sabores de conservas de peixe são mais complexos e até invulgares. “Durante décadas o setor conserveiro foi sendo maltratado pelos seus responsáveis, que não souberam entender que o caminho passava por criar produtos de elevada qualidade e com valor acrescentado”, explica Tiago Quaresma, um dos diretores da Comur – Fábrica de Conservas da Murtosa, responsável pelo conceito Mundo Fantástico da Sardinha Portuguesa, com lojas no Porto e em Lisboa.
A sardinha, considerada no passado um alimento menor na dieta portuguesa, é hoje material de trabalho para as mais variadas receitas. Na Comur, a sardinha sem pele e sem espinha tem uma “embalagem de ouro”: além da cor dourada da lata de conserva, o peixe é temperado com azeite e flocos de ouro. O preço da unidade ronda os 22 euros. Na mesma linha está a fábrica de conservas A Poveira, onde uma lata de ovas de sardinha é um “produto raro e valioso”, segundo Sofia Brandão, diretora comercial e de marketing da empresa. “As ovas (o ‘caviar’ português) são desde sempre o expoente máximo das conservas de pescado nacional, pela raridade e pelo cuidado e perícia manual na preparação”, acrescenta à NM. O custo por unidade é de 25 euros.
Mas se as ovas são um alimento pouco consensual, as algas podem ser outra das opções para combinações improváveis. De Ílhavo para as lojas de todo o país, a ALGAplus fabrica conservas de sardinha em azeite com algas, alface-do-mar e fava-do-mar. “As algas são um recurso que não é ainda devidamente valorizado. Desta forma, procuramos potenciar a democratização do seu consumo em Portugal”, explica Ana Ribeiro, gestora de marketing da ALGAplus. O preço de venda em mercearias ronda os 3,50 euros.
Tudo ao molho e fé no atum
O Prémio Ecotrophelia, que distingue a inovação no setor agroalimentar, premiou este ano uma conserva de salmão. A invenção de alunos do Instituto Superior de Agronomia, de Lisboa, e do Instituto Superior de Contabilidade e Administração, com sede em São Mamede de Infesta, vai representar Portugal no Concurso Ecotrophelia Europe, na Alemanha. O produto ainda não está em comercialização, mas lança o repto para o que ainda se pode fazer na indústria conserveira.
“Pretende-se promover a valorização dos subprodutos de salmão (cabeça, rabo e primeira posta), muitas vezes considerados como desperdício e utilizados para rações animais”, esclarece Inês Novais, um dos membros da equipa vencedora. O objetivo é chegar ao mercado nacional e, quem sabe, ao internacional. As conservas de atum também já não são como dantes. A marca Moliceiro, de Aveiro, comercializa filetes de atum com abacaxi e hortelã-menta, laranja e canela, e limão e tomilho. Nos Açores, a conserveira Santa Catarina aposta na batata doce como uma combinação. “O consumidor está cada vez mais recetivo a novidades e a sabores algo exóticos e inovadores”, diz Maria Brissos, diretora comercial e de marketing. Seja quais forem os sabores, combinações ou ingredientes, as conservas portuguesas vêm acelerando na modernização. Da lata para o prato, os peixes portugueses vendem cá dentro e lá fora, para mais de 70 países.