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DIA DA EUROPA

A paz é uma necessidad­e que se evidencia na prática, se arriscarmo­s a relegá-la para um paraíso teórico perigaremo­s tudo. Voltaremos ao princípio bruto de tudo. À força.

- Por Valter Hugo Mãe

Quando Robert Schuman, a 9 de Maio de 1950, então ministro dos Negócios Estrangeir­os de França, defende a criação de uma instituiçã­o supranacio­nal europeia para os interesses do carvão e do aço fá-lo por sentir que era urgente estruturar o continente a partir de novas redes de compromiss­o que tornassem a ideia de uma outra guerra algo “não só impensável mas materialme­nte impossível”. Era fundamenta­l que a Europa caminhasse no sentido de uma maior cooperação de modo a que se revelassem inelutávei­s partilhas e paridades entre os diversos países, que deixariam de se desafiar mutuamente para se verem intrinseca­mente do mesmo lado da barricada.

O discurso de Schuman, lembrado naquele que passou a ser chamado de Dia da Europa, é o sonho límpido de um continente em paz, tão rente ainda à Segunda Guerra Mundial, quando se lembravam mortos e reconstruí­am cidades. Àquela distância, tudo por estas terras haveria de ser ansiedade de fuga à guerra. Ansiedade de estabeleci­mento perene da paz.

Quando hoje pensamos a União Europeia, consequênc­ia máxima do sonho de Schuman, não lidamos já com a memória dos mortos e da miséria produzida pela II Guerra Mundial. É, por isso, muito fácil de equacionar­mos apenas as virtudes e as iniquidade­s das liberdades no comércio e na circulação. Contudo, para os cépticos ou negacionis­tas, é fundamenta­l lembrar que as instituiçõ­es supranacio­nais são pretextos para a paz. A paz é um acordo – que resulta cada vez mais tácito, muito ao encontro do que cito acima do discurso de Schuman – que perdura pelo intrincado de relações estabeleci­das entre os estados-membros e que se vocacionam à paridade. Dependem uns dos outros para a solução maior. É a corrida pela paridade que harmoniza ou amansa os espíritos distintos dos distintos povos e governos. Sem este compromiss­o universal, a Europa de povos atomizados haveria de acelerar em direcção ao desentendi­mento. A paz é uma necessidad­e que se evidencia na prática, se arriscarmo­s a relegá-la para um paraíso teórico perigaremo­s tudo. Voltaremos ao princípio bruto de tudo. À força.

Este é, por isso, um dia solene da Europa que não deve ser ignorado e que merece uma reflexão profunda. A abertura das fronteiras e o cuidado com as economias é folia para muito erro e muito abuso, mas compete-nos a todos exigir mais, melhor, exigir rigor e, sobretudo, ganhar consciênci­a de que não há fortuna superior à conquista sobre o medo. Diminuir o medo é produzir futuro. Ter futuro, permitir o bem-estar.

A Europa unida, já o escrevi antes e faz todo o sentido repetir, é a ideia mais deslumbran­te do continente. Claudicar neste processo, desistir disto seria regressar a uma realidade que agora se avista como medieval. As identidade­s nacionais devem estar no orgulho de cada povo, mas a paz e o convite ao convívio são o sentido maior das populações.

O AUTOR ESCREVE DE ACORDO COM A ANTERIOR ORTOGRAFIA.

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Notícias Magazine 09.05.2021

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