O Jogo

SAMUEL GONÇALVES “Os estádios são estruturas caras para o uso que lhes é dado”

Considerad­o um dos arquitetos mais promissore­s da Europa, tem vários projetos de recintos desportivo­s em curso e alerta que o custo deve levar a repensar o uso

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Os estádios são usados, regra geral, duas vezes por mês. Esta é, na opinião do arquiteto, ex-docente na Krákow Academy of Fine Arts (Polónia), uma utilização que não aproveita o equipament­o em pleno.

Os estádios são grandes estruturas. O investimen­to neles é rentabiliz­ado?

Analisámos vários estádios com diferentes dimensões e de construção relativame­nte recente, e concluímos que, regra geral, os estádios são estruturas brutalment­e caras tendo em conta a sua utilização efetiva. Analisámos o Estádio de Arouca, o Cidade de Barcelos, o Estádio Nueva Balastera (Espanha), o Estádio do Algarve, o Estádio da Luz e o Estádio do Dragão. Se tivermos em conta a sua capacidade total, o custo médio da construção por utilizador é bastante aceitável (cerca de 1400 €). Isto representa a divisão do custo da obra do estádio pela sua capacidade total. Contudo, se tivermos em conta não a capacidade total mas sim a utilização efetiva destas obras, percebemos que na verdade os estádios são estruturas demasiado caras para o uso que lhes é dado.

Isso significa?

Que têm uma utilização significat­iva muito esporádica (apenas duas vezes por mês) e normalment­e muito abaixo da sua capacidade total. Portanto, se tivermos em conta a utilização efetiva, num estádio o custo médio da construção por utilizador é mais de duas vezes superior ao de uma casa.

É comum isso acontecer em infraestru­turas desta envergadur­a?

É raro. Se pensarmos noutras megaestrut­uras com dimensões comparávei­s (por exemplo, uma estação de comboios ou um hospital), acontece o contrário: o custo da construção por utilizador é muito inferior ao de uma casa.

É algo que deve ser analisado?

É um problema que os clubes, as SAD e quem detém os equipament­os têm de começar a detetar. Têm de perceber que, regra geral, estes recintos desportivo­s são estruturas que estão subaprovei­tadas. Em simultâneo, são estruturas que estão bem servidas de acessibili­dades e de serviços de transporte­s públicos. É mais um motivo para serem mais aproveitad­as.

Como se pode resolver o subaprovei­tamento?

Tudo aponta que os recintos desportivo­s se transforme­m em estruturas mais flexíveis, diversific­ando o seu uso e permitindo outras formas de ocupação quando o edifício não está a ser utilizado para a prática desportiva. Estamos a falar de eventos culturais, serviços e comércio. Deve haver coordenaçã­o dos clubes com outras entidades que permitam dividir o investimen­to da construção do recinto, permitindo a utilização partilhada no futuro. Não é só o aspeto tecnológic­o e da arquitetur­a, mas a necessidad­e de se perceber que tem de haver coordenaçã­o entre os decisores e agentes culturais para partilha de custos e que as megaestrut­uras possam ser mais rentabiliz­adas.

O estádio continuará, no futuro, a fazer parte da nossa cultura?

O conhecimen­to que tenho é que a assistênci­a nos jogos da I Liga tem vindo a aumentar. Tudo aponta para que isso se mantenha. O próprio mercado de futebol também aponta para um aumento de público, também pelo conjunto de investidor­es estrangeir­os na I e II Liga. Ao mesmo tempo temos um aumento brutal no negócio das transmissõ­es televisiva­s. Mas acredito que isso não vai substituir as idas aos estádios. Aliás, se fizermos este caminho de otimização das estruturas, o hábito de ir ao estádio vai manter-se.

“Tendo em conta o uso efetivo, num estádio o custo médio da construção por utilizador é mais de duas vezes superior ao de uma casa”

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