O Jogo

O jogo mais igual

- Jacinto Lucas Pires

E , de repente, bum, estamos de cara para o grande momento. As folhas de calendário, que, normalment­e, desfalecem silenciosa­s e elegantes como folhas de árvore num poema garrettian­o ou cummingsis­ta, desta vez, parece que caem com o estrondo metálico de anúncios de autoestrad­a. É estranho, não é? Dá a sensação de ser cedo de mais, não concordam, caros amigos? Um jogo destes não devia ser mais para o fim, lá para o terceiro ato do campeonato, quando a história começa a pedir uma resolução? Mas não há volta a dar-lhe. O clássico é exatamente hoje às cinco e meia da tarde. Temos de nos preparar. Aqui o cronista não brinca e cumpre todos os rituais como deve ser. Vestir a camisola do tempo do Valdo, invocar as memórias mais gloriosas do Glorioso e entrar em estágio espiritual até à hora do apito.

Os clássicos são jogos iguais aos outros, pois, mas mais iguais. Desde logo, têm sempre menos de compêndio de bola do que de tratado de ganas. (Ao escrever isto, parece que ouço as vozes agudas dos picuinhas de serviço a lembrarem-me que “a componente mental” também faz parte do futebol, blá, blá. E, claro, óbvio, têm razão, mas percebem o que eu quero dizer, não é?) É importante saber se as duas equipas vão jogar em 4x3x3 e, se sim, como é que as diferentes versões desse modelo vão encaixar uma na outra. É importante perceber se as lesões de jogadores importante­s de um lado e do outro vão criar inseguranç­as em certas zonas do jogo. E é importante ter em atenção a possibilid­ade de os treinadore­s tirarem coelhos da cartola para este domingo especial. Sem dúvida. Mas mais importante do que isso tudo há de ser o espírito, a cabeça, a mentalidad­e, a atitude, o ânimo, a alma que cada equipa leva para a relva fresquinha da Catedral.

Terça-feira, em Atenas, tivemos uma ensaboadel­a de drama à antiga. De certeza que, lá no alto, os deuses que apreciam boas histórias ficaram presos aos seus cadeirões de nuvens, de olhos acesos e corações apertados. Foi um jogo tremendo que teve de tudo: bom, ótimo, mau, péssimo e até, plim, um milagre. Houve revelações magníficas. Por exemplo que Alfa é nome de estrela. Ou que está certo o nome plural de Odysseas já que o guardião tem o dom da multiplici­dade na hora agá da defesa. E foi também uma aula de, perdoem-me o palavrão, psicologia. A ver se nos inspira para este clássico das cinco e meia.

Tudo há de ser o espírito, a cabeça, a mentalidad­e, a atitude, o ânimo, a alma que cada equipa leva para a relva fresquinha da Catedral

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Alfa Semedo foi o protagonis­ta do “milagre” registado em Atenas com o AEK
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