Porque os símbolos vencem os números
E m férias com a família, passei por Barcelona. Estava um calor húmido de derreter paredes, mas não claudicámos e fomos visitar os monumentos essenciais: a Sagrada Família, a Fundação Miró, o Museu Picasso, a livraria La Central, o Parque Güell e o Camp Nou. Imaginem este cronista como um daqueles bonequinhos que o Miró da fase antipintura fazia, com os contornos a pingar de tanto sol que lhe acertava nas ideias. Os bilhetes do museu do Barça estavam esgotados, mas, mais tarde, num anexo museológico, demos de caras com um cartaz que — bem, digamos que devolveu o escritor à sua forma humana. Sim, foi uma verdadeira comoção. O cartaz, de uma beleza moderna e clássica, anunciava um jogo entre o Benfica, “Campeón Copa Europa 1960-61”, e o Barcelona, “Finalista Copa Europa 1960-61”. O meu instinto foi de escrever logo ali, de joelhos, uma crónica lírica sobre o Glorioso e o Futebol com F grande. Mas depois um diabinho sussurrou-me: não vale a pena, este é o reino de pragmatismo, ninguém quer saber disso, vão dizer que fazes florzinhas... A verdade é que já me tinha esquecido do cartazmaravilha quando li excertos da entrevista que Bernardo Silva deu à BBC, dizendo que quer jogar no Glorioso porque tem “um vazio para preencher”. Afinal, o amor à camisola existe, caramba! Não é um delírio poético deste ou de qualquer cronista, não senhor. Mais: é esse o nome da estratégia que nos pode levar de novo ao nosso lugar natural — que é o primeiro da Europa e do Mundo. Sim, caros amigos, estou a mesmo a dizer isto: “amor à camisola”. O oposto da estratégia que já começaram a querer vender-nos e que se resume em qualquer coisa como: “e, depois do Félix, também venderemos o Florentino por outra fortuna”... Não, não e não. Também por isso — porque, sim, os símbolos vencem os números — era essencial ganharmos ao plantel da SAD de Belém. Foi um jogo mais desinspirado, dir-meão. É verdade, mas é bom saber que a equipa sabe reagir a dias menos espetaculares. Rafa voltou a brilhar, com belas fintas e um chuto tão exato que o guarda-redes nem teve tempo de levantar os braços. E, depois de uma fífia de “interpretação” do árbitro nos ter anulado um golo, apareceu Pizzi, a pôr a coisa em pratos limpos. São eles, hoje, os representantes deste amor à camisola, que vale mais, oh muito mais, do que todas as cláusulas de rescisão do mundo.
Era essencial ganharmos ao plantel da SAD de Belém(...) É bom saber que a equipa sabe reagir a dias menos espetaculares