Organizadamente não organizados
O secretário de Estado do Desporto promete uma lei “inapelável” sobre comportamento das claques legais. Mas o problema são as ilegais...
Problema é transversal a todo o futebol português, pois há grupos de adeptos propositadamente não organizados e com apoios velados em todos os clubes
“Na próxima época desportiva haverá muito, mas muito mais qualificação de alguns temas que recorrentemente são falados no nosso país e, portanto, haverá punição direta indiscutível e inapelável de alguns comportamentos, nomeadamente no que se refere aos grupos organizados e interferências de outras instâncias” – a frase é de João Paulo Rebelo, secretário de Estado do Desporto, reconduzido no cargo do anterior para o atual Governo. Outro facto: o problema estende-se há mais de uma legislatura e é das heranças político-desportivas de mais difícil resolução. Porém, estas declarações revelam intenções que caem com frequência no modo meramente circunstancial. Repare-se: o governante refere-se às claques organizadas, quando o verdadeiro problema são as claques não organizadas, ilegais, autênticos fantasmas que pairam sorridentes sobre a letra da lei. A questão tornar-se-á ainda mais grave caso o Supremo Tribunal Administrativo entenda validar o recente acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul que considera inconstitucional (dito de forma resumida) condenar uma personalidade coletiva (o Benfica, neste caso) pelo comportamento dos seus adeptos quando não se prova administrativamente que são seus adeptos. O acórdão refere isso mesmo: não são seus de forma oficial, pelo que a entidade não pode ser condenada. Apesar do maior impacto dos incidentes com claques dos três grandes – e as não legalizadas do Benfica têm uma montra muito maior –, este é um problema transversal a todo o futebol português, pois há grupos de adeptos propositadamente não organizados e com apoios velados em muitos emblemas. Parece, portanto, que a Lei da Violência no Desporto, que, afinal, só entra em vigor a partir da próxima temporada, pretende conseguir o que poucas leis conseguem em Portugal: fintar os subterfúgios e os emaranhados com que é desenhada, para que não desacredite o legislador e as tutelas do futebol.