O Jogo

AGARRADAS À BOLA E AOS LIVROS

JOGADORAS Na Liga BPI, todos os clubes têm atletas a estudar, numa conciliaçã­o difícil mas a olhar para um futuro para lá das chuteiras

- CLÁUDIA OLIVEIRA

Rita Fontemanha, Laura Luís e Júlia Mateus são três exemplos de atletas que procuram terminar os cursos entre treinos e jogos, reconhecen­do que o que ganham no futebol não chega para a vida

Estudar implica dedicação. Ser atleta de alta competição também. Ainda assim, esta é uma realidade conjugável para muitas das jogadoras das equipas de futebol feminino da I Liga. A formação, a superior incluída, tomou conta dos clubes e das atletas, mesmo que isso signifique superar o cansaço dos dias de treinos intensos. De acordo com o levantamen­to feito por O JOGO junto dos clubes – o Ouriense não respondeu em tempo útil –, são 100 as jogadoras, de diversas idades e cursos, a conciliar os estudos com o futebol de alta competição.

“É uma verdadeira aventura. Não tem sido fácil porque ser atleta de alta competição exige dedicação da nossa parte em vários níveis, mas com alguma organizaçã­o tem sido possível. Há muitos dias em que não apetece... mas foi uma escolha que fiz, sabendo das consequênc­ias, porque acho queéomelho­rp ara mim e porque faço algo de bom na minha vida”, revela Rita Fontemanha, jogadora de 26 anos ao serviço do Sporting e a tirar a licenciatu­ra em Educação Física e Desporto.

“Sair com os amigos já não dá. Quase todos os dias há treino. Tenho de sair mais cedo das aulas e agora tenho de conciliar com o estágio, num programa camarário de atividade física com população sénior. Mas, sim, vale a pena o sacrifício. Gosto muito de jogar futebol. Às vezes custa ir para o treino, porque estou cansada, mas depois é sempre bom e não custa”, explica Júlia Mateus, jogadora do Albergaria.

Lidar como cansaço, assume Laura Luís, é “o mais complicado”. “Tenho de arranjar força. Há momentos em que só apetece ir para a cama, descansar. Às vezes não dá para contrariar, cedo ao descanso. Outras vezes não, sei que preciso de cumprir. Tenho o sonho de terminar a universida­de. O futebol já me deu muita coisa boa, mas, a nível financeiro, não me dá para a vida toda. Sempre quis ser professora de Educação Física e não deixei de ter esse sonho”, conta a internacio­nal portuguesa, a jogar pelo Braga.

A remuneraçã­o das atletas, é, de facto, apontada pelas mesmas como o principal fator de conscienci­alização da importânci­a de ter um curso superior.

“O futebol feminino nem se compara com o masculino, por isso temos de apostar na formação. Acredito que os rapazes, mesmo sem formação académica, têm outros investimen­tos conseguido­s ao longo dos anos, mas nós temos de fazer pela vida. Sem estudos, não vamos conseguir mais nada”, explica Laura Luís. “A vida não termina quando deixamos de jogar futebol”,

Laura Luís

Júlia Mateus

acrescenta Fontemanha.

Laura Luís esteve quatro épocas na Alemanha, Rita Fontemanha esteve duas temporadas em Espanha, ambas concordam que nesses anos foi mais difícil conciliar. “Tirei formações, mas para continuar o ensino superior era difícil, só mesmo em Portugal”, assume Rita, cuja primeira matrícula, aos 17 anos, foi no curso de Direito. “Agora, entro na sala de aula, quase todos os dias, às oito horas, e saio por volta das 13, para ir para Alcochete. Se houver aulas de tarde, tenho de faltar, não tenho alternativ­a. Mas os professore­s são compreensi­vos”, diz. Laura solta um “finalmente”, para falar da fase final da sua licenciatu­ra, cujo estágio está a desenvolve­r no Braga.

Júlia veio da Madeira para o continente quando ingressou no Instituto Superior de Viseu e o Albergaria é o terceiro clube fora da sua ilha. São 76 quilómetro­s que separam o local de estudo do recinto de treino... “Há quatro treinos por semana, mas só posso ir a três por causa das aulas, mais o jogo. Na terça, vou de autocarro. Saio mais cedo da aula, apanho o autocarro das 17h, numa viagem de 50 minutos, e vou até à sede do clube, fico à espera da carrinha e fico a dormir até ao outro dia, em casa da mãe de um diretor do Albergaria, porque não tenho autocarro para voltar no mesmo dia. Na quinta e sexta-feira vou com uma colega, que é daqui de Viseu, a Rita Coutinho. Vamos e voltamos no mesmo dia”. Rotinas exigentes de quem joga e estuda, por gosto.

“O futebol já me deu muita coisa boa, mas a nível financeiro não dá para a vida toda”

Jogadora do Braga “Às vezes custa ir ao treino, porque estou cansada, mas depois é sempre bom”

Jogadora do Albergaria

Fontemanha entra nas aulas às 08h00 e sai às 13h00 para se apresentar em Alcochete, faltando no período da tarde. Já Júlia Mateus sai mais cedo das aulas para viajar até Albergaria (às vezes de autocarro), mas falha um treino por semana

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