EM FRENTE, ROCHELE E, para os zés-ninguéns, silêncio
ivulgar ou não divulgar os insultos avulsos recebidos através das redes sociais? É um dilema com que vale a pena debatermo-nos. Rochele Nunes, judoca do Benfica, ficou em quinto lugar num torneio em Budapeste e, visto ser negra, recebeu a seguinte mensagem: “Devias ir para o inferno, macaca de merda.” Sentiu-se, evidentemente. E teve o impulso de mostrá-lo ao mundo. Mas precisaremos nós de mais uma prova de que Portugal está pejado de racismo? Não creio. O último ano mostrounos bem o ódio que se escondia sob os escombros do póscolonialismo e nas entrelinhas do sistema capitalista e suas injustiças. Ao exibir a deplorável mensagem de que foi alvo, Rochele só conseguiu duas coisas: esmurrar o peito em público e deixar uma pequena (?) parte dos leitores a considerar se, de facto, se tratava de uma macaca e realmente deveria ir para o inferno – em suma, se agora será legítimo tratar as pessoas assim, sejam de que raça forem. Disse presente, claro. É importante para um atleta mediano de uma modalidade secundária. Mas a sua reclamação dura cinco minutos. A sua vulnerabilidade a novos insultos dura muito mais. E o espaço para que outros como ela sejam insultados, vilipendiados, desqualificados, desrespeitados é de duração incalculável: estará aí muito tempo. O melhor é Rochele – a não ser que se trate de uma ameaça concreta, de uma pessoa concreta ou de um risco concreto – considerar este tipo de imbecilidade apenas uma caracterização do emissor. De resto, tenho a certeza de que esse cobarde não teria a coragem de lho dizer cara a cara. O mundo das redes sociais é um perigo para a disseminação do ódio e para a mobilização dos odiosos. Mas a maior parte dos frequentadores que as usam para insultar ainda se resume a bardamerdas acéfalos que o tempo já reduziu ao caixote dos zés-ninguéns. Mais vale deixá-los aí.