Do cartão vermelho à expulsão do adepto
Um golo anulado por fora de jogo de um centímetro ridiculariza o futebol, mas o gatilho fácil nas expulsões faz ainda pior. Valeu o V. Guimarâes para tirar uma noite do lixo e fazer dela grandiosa
Q uando se deteta um fora de jogo de um centímetro (e se fossem nove milímetros?), como sucedeu no Gil Vicente-Vizela, não falamos de tecnologia, falamos de nanotecnologia, a ciência que manipula átomos e moléculas. No caso dos árbitros portugueses, até há uma grande fação que experimenta a aplicação do mesmo princípio na redução dos onzes. As equipas ficam mais maneirinhas e fáceis de arrumar. Aos dez minutos, o V. Guimarães teve ontem um jogador expulso porque o adversário se atravessou na frente dele. Uma expulsão é sempre uma agressão ao jogo, que deve ser bem ponderada, porque o jogo importa mais do que o árbitro, principalmente se o querem vender lá fora (ao jogo e, pelos vistos, agora também ao árbitro). Não falando da propensão do apito português para se esconder atrás dos cartões (em 2020, era o 7º campeonato europeu em média de cartões mostrados), como se explica que o VAR perca minutos a verificar a legalidade de um lançamento que antecedeu um golo a 50 metros de distância, mas não verifique SEMPRE a necessidade de uma expulsão? Não é que adiantasse. O Benfica perdeu, provavelmente, a última Taça porque o seu guarda-redes foi expulso à conta de um toque indiscernível num adversário fora da sua área. Anteontem, no mesmo lugar do campo, Vlachodimos varre um atacante do Santa Clara e o árbitro fica-se por um amarelo. Que eu aceitaria (péssima foi a expulsão na Taça), atenção, apesar de todos os analistas de arbitragem insistirem no imperativo do vermelho nesse lance. Na verdade, não foram formados para pensarem em defender o espetáculo nesse sentido, embora me pareça que alguns deles o fariam por terem sensibilidade para o jogo. Por felicidade, o cartão que me fez voltar a um tema recorrente funcionou ao contrário. Salvo o azar de Rochinha, o V. Guimarães-Belenenses acabou por ser o que Pepa lhe chamou no final: épico. Pelo que jogou (até com nove), pelo que o seu público fez e por ter levado com o árbitro Hélder Malheiro, o Vitória merecia que a Liga lhe atribuísse seis pontos “honoris causa”. A descontar nos créditos de quando o campeonato for vendido lá fora.