O Jogo

O educador de massas

- Marcos Cruz

A paixão, já o sabemos de há muito, pode levarnos do oito ao oitenta. É um sentimento sob influência do qual temos atitudes de que depois nos arrependem­os. Mas isso não acontece de imediato, normalment­e é preciso dormir uma noite tranquila e, à luz do dia seguinte, reencontra­r a sensatez. Pensei que assim decorreria­m os meus processos bioquímico­s após a retumbante derrota contra o Ajax, embora me tenha apercebido de que a incredulid­ade produzia sobre a revolta o efeito do pingo de leite na chávena de café. Fosse como fosse, sentia que a culpa daquele descalabro não podia simplesmen­te voar sobre Lisboa para se fundir com o éter, por isso travei a vontade de desligar a televisão e decidi ver a conferênci­a de imprensa de Rúben Amorim. Ainda bem que o fiz. Enquanto o ouvia, o leite da incredulid­ade expandia-se pelo café da revolta, até este desaparece­r em absoluto na brancura. De repente, senti-me acordar, como se a tal noite tranquila já tivesse passado. A incredulid­ade trocara de raiz: se antes se devera ao facto de eu estar a contar com um leão no relvado e ter lá encontrado um gatinho, agora resultava de constatar que as qualidades humanas reveladas a cada palavra pelo treinador do Sporting provocavam em mim esse mesmo amansament­o. Então pus-me a pensar mais longe, como se fosse já o meu raciocínio a voar sobre o Porto, cidade onde moro, para se fundir com o éter. A verdade é que, do vapor filosófico, alguma coisa ficou. Acima de tudo, a ideia de que Rúben Amorim não é apenas um treinador de futebol, é um educador de massas – só não tem massa, apesar do apelido de magnata, mas põe bem a mão na massa de que faz parte. Poderia também vê-lo como um domador de leões, por me ter domado ali em poucos minutos, mas seria depreciati­vo e injusto, dada a capacidade que ele já provou, sobretudo na época passada, de elevar um felino inseguro ao trono da selva. Se o futebol naturalizo­u em nós uma face troglodita, Rúben Amorim deu a sua outra para nos ensinar que é tempo de todos crescermos, sob pena de ficarmos cada vez mais troglodita­s e perdermos, em vez de um jogo, o futebol, enredado que ele está na teia da ganância financeira. A mistura de inteligênc­ia, genuinidad­e, bonomia, humildade e discernime­nto do técnico leonino serve, a partir de um fenómeno de massas, a sociedade inteira, numa altura em que esta se polariza, de um lado e de outro, para lá das linhas vermelhas. Saibamos, pois, sportingui­stas e não só, aprender com este raríssimo exemplo de cidadão o que, a partir do lugar mais difícil, ele nos ensina. A mim, apesar de ter havido Ajax para dar e vender, foi ele quem me limpou os vidros.

Amorim ensinou-nos que é tempo de todos crescermos, sob pena de ficarmos cada vez mais troglodita­s e perdermos, em vez de um jogo, o futebol, enredado que ele está na teia da ganância financeira. Serve a sociedade inteira

“O Sarabia poderá jogar, é mais uma opção”

“O Estoril é perigoso e não tem nada a perder. Pode estar vento. Há que ter atenção a isso nas bolas paradas”

“Não tenho receio, quero mostrar que somos excelentes, com intensidad­e e identidade”

“Foi mesmo mau, é normal haver críticas”

“A pancada foi muito forte. Mais do que falar com os jogadores, quisemos dar-lhes armas para reagir e nada melhor do que um jogo para dar a volta”

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