O Jogo

De boas intenções está o inferno tático cheio

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1 O princípio, segundo revelara Fernando Santos, era o melhor: “consolidar a forma de jogar”. Essa intenção positiva resultava dos últimos jogos terem revelado uma evolução ideológica de relação com a bola e tipologia dos jogadores para dar vida ao sistema (menos de expetativa e elementos “fecha-trincos”, mais assumir bola e elementos “roda-baixa” de posse). Claro que as nuances estratégia­s mudam em face do nível dos adversário­s, mas ter este princípio para defrontar a Espanha mostrava o querer da nossa Seleção assumir o seu jogo (e não o de travar o do adversário) como referência de colocação em campo. Por isso, mexeu pouco no onze em relação ao “play-off ”, buscando manter esse padrão. Do outro lado, porém, estava uma seleção mestre a roubar ideias de jogo aos adversário­s bem intenciona­dos. Como? Através de outro elementar roubo: o da bola (a única em campo). Foi algo demasiado evidente quase todo o jogo mas sobredimen­sionado na primeira parte, levando a equipa portuguesa a exagerar na busca da profundi-* dade porque não conseguia segurar a bola para construir. 2 Santos tinha dito, também, numa tentativa de desmitific­ação, que o futebol é o “jogo do golo” e não o “jogo da posse”. Será como objetivo final (o resultado) mas para chegar lá a melhor e mais eficaz forma é (tirando a chamada “estratégia contacorre­nte” que não faz sentido no nível que a nossa seleção atingiu) tendo a bola o mais tempo e perto possível da baliza adversária, circular com qualidade até descobrir espaços de penetração e último passe como elo para o tal jogo do... golo. A ordem natural é esta, nunca outra. E foi com Rúben Neves em campo, como “6” de receber a bola e fazer variar o jogo, que a Seleção cresceu e conseguiu algum equilíbrio num jogo que foi quase sempre propriedad­e dos espanhóis. 3 A transmissã­o já ia com meia-hora e os grandes planos dos jogadores portuguese­s eram monopoliza­dos por um que nem estava a jogar. Ronaldo, claro. Quase inexpressi­vo, ele soube estar no banco. Qualquer reação dele de desagrado ao jogo (e não faltaram ocasiões nesse tempo) iriam ser, naturalmen­te, sobredimen­sionadas. A obrigação de gestão física nesta fase da época suportou a “decisão técnica”. Apesar do bom jogo, sobretudo em apoios, de André Silva, a Seleção continua a necessitar do Ronaldo como ser seletivo na ocupação de espaços de remate com gestão de esforço (no jogo). Falar dele, como fez Rangnick, que “não é um monstro a pressionar”, é, ao mesmo tempo, um erro de prisma de avaliação a um jogador destes, agravado por o ser numa fase da carreira em que, obviamente, não se pode desgastar nisso sob pena de perder o que hoje tem e que é (como já disse Santos e logo frisou Ten Hag ao chegar a Manchester) tão só o tal simples “jogo do golo” (quando surge a “tal bola”).

Ronaldo soube estar no banco num jogo em que a Espanha nos roubou a ideia

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Unai Simón, guarda-redes da Espanha, mergulha aos pés de Cristiano Ronaldo

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