O Jogo

O jogo da posse e do golo

- Luís Freitas Lobo luisflobo@planetadof­utebol.com

1Pegando na dicotomia lançada por Fernando Santos antes deste ciclo, o resultado pode facilmente convencer todos que esta exibição consagra a tese do jogo do golo (que os pragmático­s defendem) para definir o futebol em detrimento do jogo da posse (que os estéticos idolatram). Pode ser, para quem entrar no estádio ao minuto 90 e olhar para o marcador eletrónico. Não é, certamente, para quem entrou desde o primeiro minuto e viu o jogo em termos de relação com a bola e associação de passes progressiv­os (pelos três corredores) que a seleção portuguesa ativou no seu processo de construção de jogadas de trás para a frente, viajando junta, em posse objetiva, até ao tal jogo do golo que mostrou como deve Ronaldo continuar intocável no onze com essa mera função especializ­ada e decisiva de remate. Não lhe peçam mais nada. Esqueçam o pressionar (tirando um cheirinho no central que quiser sair por dentro). Ele tem de ser hoje o homem para um plano só: o do remate com instinto de oportunism­o perfeito para perceber onde se colocar para o fazer. Dessa forma, só na primeira parte, fez dois golos de remate a encostar e falhou incrivelme­nte outros dois já feitos. Em suma: ele é a personific­ação do jogo do golo. O resto da equipa é a imagem do jogo da posse.

2Essa posse não é, porém, o argumento de superiorid­ade moral estética de jogar. É, pelo contrário, a superiorid­ade efetiva de pegar no jogo (com bola) e com... pragmatism­o dominador. Para, nesta fase, atingir esse nível exibiciona­l, é decisivo ter um nº 6 que saiba receber com radar ativado e de antenas táticas na cabeça rapidament­e definir qual o corredor para fazer circular a bola dando à equipa a melhor opção de sair para o ataque. A este mero gesto chama-se transição ofensiva. E esse “6” é Rúben Neves. Neste desenho, a afirmação de William Carvalho a “8” (uma opção tático-posicional desde há muito assumida para ele por Santos) dá uma dimensão física ao nosso meio-campo sem perder nada de qualidade técnica (até acrescenta­ndo pela forma como Willam sabe ter... posse, e depois passe). Desmistifi­ca a sua lentidão nessa posição porque em que em vez de ter de sair da pressão, como tinha de fazer jogando a “6”, passa a ter de queimar linhas em construção, como se lhe pede jogando a “8”. Com esta dupla complement­ar de saída e transporte (NevesWilli­am), pode surgir um “10” feito a partir do outro “8”, que é Bruno Fernandes. Solta-se melhor, joga mais. Fazer esta distribuiç­ão de jogo em 4x3x3 frente a uma seleção taticament­e tão consistent­e como a Suíça (mas desmontada na sua ligação entre peças de organizaçã­o defensiva) mostrou o caminho ideal, de jogo e golo, para a seleção portuguesa.

Como o jogo do golo só existe como corolário de uma boa ideia de jogo quando antes existe a melhor expressão do jogo da posse

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Um dos dois golos de Cristiano Ronaldo frente à Suíça

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