Vieira, Varandas e a “não-agressão”
Não vi a entrevista que Luís Filipe Vieira deu na semana passada à CMTV, mas como qualquer pessoa não tive forma de não saber o essencial daquilo que disse. Não me interessam especialmente os muitos mimos que aparentemente dirigiu aos atuais dirigentes do Benfica. A parte que me chamou a atenção foi aquela em que disse que celebrou com Frederico Varandas um “pacto de não agressão” com o intuito de nivelar por baixo os tetos salariais das modalidades, pacto que ambos os clubes terão cumprido. Há algumas semanas escrevi aqui sobre a coima que a Autoridade da Concorrência aplicou à Liga de Clubes e aos seus associados, por causa de um outro “pacto de não agressão” – no caso, o de não contratarem jogadores que durante o período da pandemia rescindissem contrato com clubes rivais. Nesse texto, alertei para que (tanto quanto pode perceber um leitor de jornais medianamente atento ao fenómeno futebolístico) há entre a generalidade dos nossos clubes portugueses relações demasiado próximas, que sem dificuldade se podem considerar como proibidas pelas regras
Vieira resolveu fazer um favor ao regulador e confessar publicamente a celebração de um acordo a todos os títulos lícito e lesivo
da concorrência. Por isso mesmo disse que não me espantaria se em breve a AdC agisse sobre os clubes de forma bastante mais enérgica. Ao que parece, Vieira resolveu fazer um favor ao regulador e confessar publicamente a celebração de um acordo a todos os títulos lícito e lesivo da concorrência e dos direitos dos próprios atletas. Como explico sempre aos meus alunos na primeira aula de Direito da Concorrência, as empresas estão no mercado para competir, e não para serem amigas. E isto é assim precisamente porque quando colocam o cavalheirismo acima da concorrência estão quase sempre a lesar terceiros – no caso, os seus trabalhadores e os consumidores do espetáculo que oferecem. Um pacto de não concorrência entre empresas, como é claramente o caso deste, é proibido e punido com coima que, em função dos factos e entidades envolvidas, pode ser bastante choruda. Das duas uma: ou Vieira não tinha consciência da gravidade do que veio confessar na TV, ou achou que por estar fora do clube isto é um assunto que já não lhe diz respeito. Mas convém que saiba que os administradores das empresas envolvidas em acordos deste tipo podem eles próprios ser pessoalmente punidos. Já para não falar, como é claro, dos atletas que viram os seus salários rebaixados em resultado deste “pacto”. Eu sei bem o que faria se fosse a eles…