O Jogo

A necessidad­e do jogador renascer várias vezes

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1 A avaliação de um jogador tanto pode basear-se no que ele indiscutiv­elmente vale, como pode ser motivada por imaginar, em face de indícios dados numa equipa dita menor, o que poderá valer num contexto de exigência superior. O habitat de expressão de talento confunde, muitas vezes, a avaliação de um talento. Seja certeza ou promessa. É a dicotomia existencia­lista do talento. O jogador que é grande numa equipa pequena, mas que fica pequeno numa equipa grande. Chamam-lhe o síndroma do peso da camisola. Há muitos casos destes pelo mundo fora. Ultrapassa a visão desportiva. Passa, quase sempre, para a de amplitude mental-humana. Outra coisa é a dúvida sobre a expressão desse potencial noutro cenário. Penso na dimensão competitiv­a como em maiores exigências táticas de participaç­ão no jogo. Como isto funciona melhor com exemplos, dois nomes: Darwin e Lincoln. 2 Lincoln é um craque que ainda tem o seu potencial confinado. O Santa Clara tem sido uma equipa bonita e ele é o criativo-vagabundo do passe que vai buscar o perfume dos velhos “10” e joga metendo a bola onde quer (após colocarse no local certo para a receber). É difícil imaginá-lo sem a bola. A foto fica incompleta. E o seu melhor jogo também. Passando para uma equipa grande ele terá, ao mesmo tempo, o benefício e a exigência das duas coisas. Ou seja, vai ter mais a bola mas não será tão livre a mover-se (pelo maior balizament­o de espaços de movimentaç­ão) e deverá ter maior intensidad­e de reação à perda (além da maior agressivid­ade em posse). Se pensar nele no “modeloPort­o de Conceição”, não duvido que joga fácil como “terceiro médio” ofensivo de raiz e que terá de subir esses índices intensos a “8”. O maior desafio, porém, será replicar os movimentos “faixa-meio, meio-faixa” transforma­dores de sistema de Otávio. Como acho que o talento encontra sempre uma saída, acredito que consegue, mas para isso terá de nascer um novo “Lincoln tático”. Isto é, usar o seu talento natural num habitat que sem lhe ser hostil, coloca-lhe primeiro obrigações e só depois liberdades (e estas sempre condiciona­das). 3 Os jogadores são mais produto do local onde nascem do que onde crescem. Digo isto porque quase todos eles têm resistênci­a a crescer porque relacionam isso com perder muito daquilo que os fez destacar-se. Uma missão do treinador é convencê-los que não é assim e que o cresciment­o não “envelhece” o jogo mas sim dá-lhe mais sabedoria. Desde que, claro, não subvertam a ordem e a prioridade de como começar a pensar o jogo para este tipo de jogadores: com bola. Porque se lhes começam a explicar o jogo sem bola como base para crescer é o princípio para ele perder-se. Eles não gostam que lhes recortem as fotos de infância e tirem o peluche (bola) dela.

Eles não gostam que recortem fotos de infância e tirem o peluche (bola) delas

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É fácil imaginar Darwin nos ataques rápidos do Liverpool, mas terá de se adaptar

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