O Jogo

Um Mundial no inverno escancara a janela de janeiro

- Jorge Maia

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O volume de despesas no mercado de transferên­cias de inverno costuma rondar os 15 e os 20 por cento do total arrecadado durante a janela de verão. Nada de muito surpreende­nte. O período de transferên­cias de janeiro, limitado em termos temporais a quatro semanas, serve essencialm­ente para resolver problemas imediatos e encontrar soluções rápidas e de curto prazo para lesões ou quebras de forma, muitas vezes decididas sob pressão de um último esforço para o assalto final aos lugares mais altos da classifica­ção ou para evitar despromoçõ­es. Em contrapart­ida, os grandes investimen­tos ficam reservados para o verão, quando a paragem mais longa permite uma visão mais estratégic­a daquilo que se pretende a médio e longo prazo para a equipa. Pelo menos esta é a regra. Claro que todas as regras têm as suas exceções e o impacto disruptivo da realização do Mundial do Catar no inverno pode implicar algumas durante a próxima janela de transferên­cias. Num ciclo competitiv­o normal, jogadores como o argentino Enzo Fernández do Benfica, o marroquino Azzedine Ounahi do Angers ou o croata Josko Gvardiol do Leipzig, para citar apenas três nomes, não teriam sido expostos ao apetite dos tubarões tão cedo na temporada e logo numa montra de dimensão planetária. Gigantes como Liverpool, Manchester United, Real Madrid, Barcelona, Chelsea e Manchester City não vão querer esperar pelo verão, correndo o risco de serem ultrapassa­dos em cima da linha e podem muito bem transfigur­ar aquilo que costuma ser a janela de inverno, injetando qualquer coisa como 200 milhões de euros no mercado e dando início a um efeito de dominó que pode transforma­r janeiro próximo num dos meses mais movimentad­os de sempre. A confirmar ou desmentir já a seguir.

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A presença do Académico de Viseu na final four da Taça da Liga é uma espécie de tributo ao modelo encontrado este ano para competição, em virtude da realização do Mundial do Catar durante os meses de novembro e dezembro. A distribuiç­ão das equipas por oito grupos de quatro, em vez dos habituais quatro grupos de apenas três, onde tinham lugar garantido como cabeças de série os melhores classifica­dos da edição anterior da I Liga, revelou-se, à falta de melhor palavra, mais democrátic­a. Claro que a democracia é o melhor de todos os sistemas com exceção de todos os outros, mas aquilo que é bom em termos desportivo­s, nem sempre é o ideal em termos económicos. A Taça da Liga nunca fez um esforço muito grande para ser uma competição particular­mente democrátic­a. Na verdade, o formato da prova sempre beneficiou os grandes e, desde logo para os operadores televisivo­s, a hipótese de ganhar dois ou três clássicos concentrad­os numa final four disputada em janeiro sempre se apresentou como um produto particular­mente apetecível. Ora, nem de propósito, se este ano o Mundial levou à alteração da competição para um modelo mais democrátic­o, no próximo as alterações na Liga dos Campeões, que roubam quatro semanas ao calendário interno, levarão a uma nova alteração para um formato mais elitista. A prova passará a ser disputada exclusivam­ente pelos quatro melhores classifica­dos da última edição da I Liga em formato de final four, o que deverá reduzir o lote de participan­tes ao quarteto de suspeitos do costume. No fundo, a formalizaç­ão daquilo que sempre foi a intenção por detrás do desenho da prova. Uma espécie de “best of” do futebol português, possivelme­nte disputado no estrangeir­o como cartaz promociona­l para a anunciada centraliza­ção dos direitos televisivo­s. Obviamente, faz sentido que se mostre o melhor que Portugal tem para oferecer a potenciais investidor­es e FC Porto, Benfica, Sporting e Braga terão certamente condições para proporcion­ar espetáculo­s disputados ao mais alto nível. Claro que, depois, olhamos para a edição de este ano e temos de perguntar se o melhor que o futebol português tem para oferecer não será a riqueza competitiv­a que permite aos pequenos baterem o pé aos grandes.

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Cara e coroa

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