O Jogo

(des)Igualdades

- Luís Cassiano Neves

Na primavera desportiva nos EUA, assistimos a um dos fenómenos mais interessan­tes da indústria: O NFL Draft. Este evento de três dias é a primeira fonte de recrutamen­to das 32 equipas que compõem a principal “divisão” do futebol americano. Comparando, seria como se durante um fim de semana do mercado de transferên­cias, as equipas da primeira liga pudessem escolher os melhores jogadores da Liga Revelação. Mas as diferenças são muito mais do que as semelhança­s. Para começar, a ordem das escolhas: a primeira escolha está reservada para a pior equipa da temporada anterior. Ao longo dos anos, várias regras do Draft foram sendo alteradas, mas esta permanece, baseada num princípio sagrado da NFL: as equipas, mais do que concorrent­es, são sócias de uma mesma competição. Competição que se preze deve ter igualdade e incerteza. É como se o Barcelona oferecesse ao Elche a possibilid­ade de contratar o Neymar para que na próxima temporada fosse um adversário mais duro de roer. O Draft, à semelhança do nosso mercado de transferên­cias, é tema de debate, análise, e conversa de café. Mas a NFL tira dele rendimento. As entradas são gratuitas, mas o acolhiment­o do evento e a sua transmissã­o são alvo de licitação por parte de espaços, governos locais e broadcaste­rs. Segundo a NFL, mais de 300 mil pessoas passaram pelo festival que se montou em torno do Draft de 2022, em Las Vegas. As audiências estimam-se em mais de 11 milhões, entre TV e streaming. O que pode o nosso futebol aprender com algo tão simples como uma feira de talento? O mais óbvio será um princípio de igualdade. Dotar as equipas que estão mais abaixo de melhores recursos ou de acesso facilitado aos mesmos. Curiosamen­te, a comparação entre o mercado de transferên­cias (economia de mercado) e o Draft (economia planificad­a) parece contrário aos princípios de liberalism­o económico americano, mas esta ideia esbarra no facto de as equipas terem de comprar a sua entrada numa determinad­a liga. A Liga Portugal tem dado passos no sentido de tornar a nossa Liga mais equitativa. É um passo lógico para quem deverá a partir de 2027 vender o nosso campeonato num mercado global competitiv­o. Aqui surge a segunda lição: tudo deve ser experiênci­a, tudo deve ser espetáculo. O adepto não quer apenas assistir a 90 minutos de futebol, quer sim ver-se envolvido no dia-a-dia do seu clube e atletas preferidos.

 ?? ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal