Não há milagres na arbitragem
A ideia de que entregar a arbitragem a uma entidade externa pode resolver todos os problemas do setor é desmentida pelo eloquente exemplo inglês. E não, não é um bom exemplo.
Num artigo publicado em março no The Guardian intitulado “O trabalho impossível: por dentro do mundo dos árbitros da Premier League”, o jornalista William Ralston dava conta da crescente contestação ao trabalho dos juízes em Inglaterra – treinadores, adeptos e comentadores concordam que a “qualidade tem decaído” – mas também da dificuldade que a Professional Game Match Officers Ltd [PGMOL], empresa criada em 2001 e que gere o setor, tem sentido para contrariar as críticas. Desde a criação da PGMOL, os árbitros que fazem parte do grupo de elite cumprem um programa de preparação física estruturado e marcam presença em sessões de treino bissemanais, analisam lances polémicos e recebem aconselhamento de especialistas técnicos, psicólogos e nutricionistas. Entre as épocas de 2003/04 e 2009/10 o número de sprints realizados pelos árbitros subiu de uma média de 19 por jogo para 41. Em Inglaterra, ninguém contesta que os juízes estão fisicamente melhor, mas apitam pior. Ao ponto de se falar de uma crise, traduzida nos afastamentos de Lee Manson, que errou na colocação das linhas de fora de jogo em dois jogos e, logo a seguir, de Neil Swarbrick, diretor do VAR da PGMOL, por ter falhado um cartão vermelho. Serve a introdução para sublinhar que a criação de uma entidade externa para gerir a arbitragem, como propôs ontem a FPF, não vai produzir um milagre e a ideia de que tudo funciona às mil maravilhas em Inglaterra só se explica com falta de informação. Claro que não é possível olhar para a degradação do setor em Portugal e não mudar nada, mas é preciso moderar as expetativas. E, sobretudo, não mudar alguma coisa apenas para que tudo possa continuar na mesma.