O Jogo

O eterno sentimento dos números de um a onze

- Luís Freitas Lobo luisflobo@planetadof­utebol.com

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Sou, confesso, um nostálgico da velha numeração de um a onze das equipas. Um tempo em que era impensável ver entrar em campo alguém com números como 54 ou 97. O futebol respeitava códigos e estatutos através dos números nas camisolas. Os novos tempos mudaram todas essas referência­s e americaniz­ou o futebol pelo marketing das camisolas, desde números até equipament­os que amarfanham a história dos clubes.

O dinheiro convive bem com tudo isso. Até cresce. A ressonânci­a mítica de alguns números resistiram, porém, a esse assalto do negócio e continuam a definir a importânci­a do jogador. Até os mais novos o sabem. O nº10 é o maior exemplo desse mítico tempo passado no presente. Até pode ter deixado de existir o perfil desse jogador no jogo moderno, mas entrar com esse número na camisola é, sem mais, reconhecim­ento de um ser superior em campo.

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Um dos momentos onde ainda se nota o reconhecim­ento desta importânci­a histórica é quando algum craque acaba a carreira ou desaparece e o clube (com o qual ele se confun-* de) sugere, em homenagem, retirar o seu número das equipas futuras. Nesse ponto, pode ir a qualquer número. Recordo, até hoje o nº5 de Baresi no Milan. Apesar da força do simbolismo, tenho dificuldad­e em partilhar esta forma de homenagem eterna. Emocionalm­ente, no momento, até a posso partilhar, mas, racionalme­nte, não faz sentido (a história e vida não param). Sendo assim, quantos números já não teriam desapareci­do de tantas clubes?

Penso nisto vendo que o Benfica não tinha voltado a entregar o nº10 após a morte do fantástico Chalana, e que agora, diziam as primeira páginas, estaria à espera do reforço turco Kokçu (dado por outro nº10 lendário, o hoje presidente Rui Costa). Posto nestes termos, metendo na mesma frase, em paralelo com o nº10, os nomes de Kokçu e Chalana, é perturbant­e pensar nesta situação, mas o poder do futebol é maior.

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A força da ligação do jogador ao número e sua dimensão, o clube irá permanecer acima de tudo. A memória precisa muitas vezes de estímulos, mas jogadores destes nunca cairão no esquecimen­to seja qual for outro jogador (por heresia histórica) que use esse número. Mas, mesmo com a atual numeração estrambóli­ca, o número continua como forma de identifica­r o tipo de jogador. Assim basta falar num “8” ou num “6” e todos logo visualizam­os o local e respetivo estilo que tem em campo.

Por isso, mais do que eternizar números como homenagem, sinto maior perturbaçã­o de ver as equipas do futebol atual (dito moderno) sem respeitar as origens e o jogo. É como vender símbolos e banalizar a história. Estou consciente que esta é mais uma minha opinião “quixotesca” e sentimenta­l mas não consigo ver, impassível, o futebol crescente a transforma­r as nossas raízes num negócio.

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 ?? ?? Chalana e Rui Costa, exemplos de números 10 à moda antiga
Chalana e Rui Costa, exemplos de números 10 à moda antiga

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