O Jogo

A Europa nunca deixará de ser branca

- Planeta Futebol Luís Freitas Lobo

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Antes do jogo, parecia que mais do que podia jogar o Borussia Dortmund (a sua estratégia e extremos rápidos de contra-ataque) o que fazia temer ao Real Madrid (catorze vezes mais favorito à espera da 15.ª Champions) eram mais as armadilhas traiçoeira­s que qualquer jogo pode trazer. E eles até apareceram contra um onze alemão que saído do quinto lugar da Bundesliga chegava a Wembley para desafiar o destino anunciado.

Que ninguém lhes dissesse no túnel antes de entrar em campo que existiam impossívei­s no futebol. Aquela bola na profundida­de metida em Adeyemi logo pouco depois do início (passou Courtois e perdeu ângulo de remate) fez crescer essa sensação junto com outra oportunida­de logo a seguir nesse mesmo estilo (aproveitan­do o losango branco subido) mas, ao mesmo tempo, não marcando, deixou o sinal de que criar ilusões contra o Real Madrid (seja qual for o resultado) é jogar/brincar com o fogo.

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Foi uma primeira parte com o Real Madrid, sem brilho, a jogar com a história. Olhar para o seu onze e não ver nele, no seu 4x4x2 em losango com a dupla móvel Vinícius-Rodrygo, mas sem nenhum ponta-delança de raiz é a melhor prova desse sentimento merengue (pós-Raul, Ronaldo ou Benzema) que confia no seu “pedigree” e entrava para jogar uma final europeia com a camisola n.º 9 mais tradiciona­l vazia, à espera do futuro dono que chegará na próxima época, Mbappé.

Sem estados de alma, o Real deixou passar 45 minutos quase sem mexer um nervo da face perante a concentraç­ão e, até, algum risco de subir linhas do Dortmund, o exército tático de Terzic em 4x2x3x1 (com o duplopivô Can-Sabitzer a segurar) com maior iniciativa mas, nem por isso, com maior poder de ameaça.

É a pior sensação que as grandes (gigantes) equipas podem dar: transmitir sentimento de superiorid­ade mesmo sem ter a bola e nem estar sequer a jogar bem mas que, sabemos todos, podem inventar um lance de golo de qualquer lado. É (outra forma) de definir o Real Madrid.

3Mas por que é que o Real Madrid estava tão parado vendo os jogadores do Borussia chegando sempre primeiro à bola? Em poucos minutos da segunda parte, vimos outra velocidade individual com Vinícius. O tipo de jogador que pode jogar um jogo diferente de todos os outros em campo. Qualquer adversário olha para ele de lado e sente o temor de não ir conseguir parar o que vai tentar fazer.

Os 350 passes completos que o Borussia tinha (o dobro dos madrilenos) com menos de uma hora, mostrava que a equipa sabia pressionar, recuperar e tocar. Até nas “faltas táticas” estava melhor. Qualquer avançado gosta mais de atacar do que (ter de) defender, mas estes homens da frente de Dortmund estavam preparados de jogar nessas “duas vidas” com a mesma disposição. O futebol com o Real Madrid no meio tem, porém, outras formas de vida quase extraterre­stres.

4Carvajal (a correr toda a faixa direita) e Valverde como um vértice-ala direito, pareciam os pontos do Real mais metidos no jogo mas sem conseguir pegar nele (só em jogadas). O duplo-pivô defensivo alemão não parava de morder Bellingham e o inglês dava passos atrás. O meu momento vai chegar, pensaria o “paciente (craque) inglês”. O convidado improvável foi, porém, o primeiro da frase que corria mais, a surgir no primeiro poste. Não procurem muita lógica nisto. O lateral-direito (com 1,73m) marcava um golo de cabeça num canto.

O jogo mudava perante o olhar dos jogadores de Dortmund. Até Camavinga (impecável antes na burocracia do n.º 6 de passe simples na saída de transição defesa-ataque) subia no terreno e rematava. Quase como eclipsados pela força do destino, a equipa toda do Boruussia desaparece­u coberta por um manto branco de futebol que teve, para o golpe final, Vinícius e a sua intimidade com a bola. O Real Madrid joga estas finais e ganha-as porque não há outra equipa que saiba aguentar sem pestanejar os momentos mais difíceis do jogo, passar por eles como a coisa mais natural da vida e, depois, aproveitar o momento seguinte para os ganhar. Quanta vezes já vimos esta história branca?

Que jogo de Carvajal, como lateral, todo-o-terreno e homem-golo de cabeça!

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