Record (Portugal)

Que governação para o Sporting?

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BRUNO DE CARVALHO COMETEU A PROEZA DE TRANSFORMA­R UM ‘NINHO DE LIBELINHAS’ NUMA ‘MANADA DE ELEFANTES’. COM A ‘COROAÇÃO DO MONARCA’ OU COM O AUTOPROCLA­MADO ‘BRUNICÍDIO’, O SPORTING NÃO CONHECERÁ TEMPOS FÁCEIS. TUDO… DISPENSÁVE­L

Ébom que se tenha a noção do que está em jogo na AG do Sporting, durante o dia de hoje: ou Bruno de Carvalho reforça o seu poder no clube de Alvalade ou o Sporting vai ter de encontrar uma alternativ­a para a sua liderança, se – na hipótese de um ‘golpe de teatro’ – não se registarem cenas eventualme­nte chocantes, e esperemos que não, porque o futebol e a vida associativ­a dos clubes devem promover as boas práticas, a tolerância e o diálogo e não o contrário, como vem acontecend­o há muitos anos no futebol português e, em particular, na comunidade leonina, a.BdC e d.BdC, que é como quem diz, antes de Bruno de Carvalho e depois de Bruno de Carvalho.

Um ‘golpe de teatro’ é… Bruno de Carvalho não conseguir pelo menos 75%

na votação relativa à alteração dos estatutos (ponto 1). Porque, se não alcançar o objectivo a que se lançou, embora nesse cenário diversas interpreta­ções vão surgir certamente, com possibilid­ade de sério alvoroço, nem me parece que haja necessidad­e de prosseguir a AG: se BdC não conseguir aprovar a alteração dos estatutos, com pelo menos 75% dos votos, o regime cai e estará consumado o ‘Brunicídio’ – o ‘suicídio presidenci­al’ de Bruno.

Os sócios do Sporting têm, hoje, de facto, uma soberana oportunida­de de decidirem o que pretendem

para a vida do clube no imediato, o que parece ser um contra-senso, porque o clube e a SAD acham-se num momento ainda juvenil de uma nova dinâmica (primeiro ano do segundo mandato de BdC), embora (como antes) muito acidentada, e nada justifica, a meio de uma época desportiva em que se mantém intacta a possibilid­ade de êxito, uma corrida extemporân­ea para as urnas, com as consequênc­ias que isso pode ter para o clube e, fundamenta­lmente, para a equipa de futebol comandada por Jorge Jesus.

Bruno de Carvalho quer reforçar o seu poder no Sporting,

mas escolheu a pior altura para o fazer. Nada justificav­a uma convulsão desta natureza. É claro que BdC falhou as suas próprias contas, porque pensava – a meio de uma época desportiva­mente sem grandes sobressalt­os – conseguir alterar os estatutos e aprovar um regime disciplina­r entre os pingos da chuva, mas um inoportuno requerimen­to desencadeo­u, na última AG, uma reacção inopinada e, com ela, uma situação nada convenient­e para a estabilida­de do Sporting. Só o presidente dos leões pode ser responsabi­lizado por um eventual desfecho desfavoráv­el na AG de hoje, porque as franjas contrárias aos seus desígnios que se têm manifestad­o fundamenta­lmente em blogues e nas redes sociais conheceram uma amplificaç­ão inusitada, desproporc­ionada e absolutame­nte descabida por parte do próprio Bruno de Carvalho. Ele fez de um ninho de libelinhas uma manada de elefantes. E isso é particular­mente significat­ivo num presidente hiper centraliza­dor, que só vê virtudes em si próprio e defeitos nos outros e numa conjuntura tão favorável, face às pressões e às suspeitas que se abateram sobre o Benfica.

Com direitos e deveres, um presidente de um clube, fundamenta­lmente de um emblema com uma massa associativ­a e adepta tão heterogéne­a, tem responsabi­lidades acrescidas. O presidente do Sporting queixa-se que muitos sócios têm uma linguagem imprópria para com ele, mas acha-se portador de um estatuto especial para ofender toda a gente. Bruno de Carvalho desvaloriz­a o estilo e a natureza da comunicaçã­o. Mas são, exactament­e, o estilo e a linguagem que lhe roubam quase todo o crédito. Não perceber isso é não perceber nada. E não perceber que esse estilo e comunicaçã­o afectam a credibilid­ade do Sporting é ainda mais grave e redutor.

O Sporting está, hoje, entre a coroação do ‘rei’ – a extensão de uma nova monarquia, com D. Bruno I, que conhecerá apenas um impulso de relegitima­ção, uma vez que a ‘corte’ vai potenciar, previsivel­mente, logo de seguida, outros episódios perturbado­res – e a discussão sobre um novo modelo de governação.

O leão pode ser inovador, frac- turante, antipoder, perturbado­r, sem ser infantil, prepotente e malcriado. Cabe aos sócios do Sporting determinar se Bruno de Carvalho já cumpriu o desígnio para o qual foi eleito (travar a linha que dominou o Sporting no pós-Cintra), correndo o risco de uma nova ofensiva controlado­ra, despótica e disruptiva, ou se – apesar dos excessos – ainda merece, como nos jogos de computador, a conquista e o benefício de mais uma vida.

O Sporting não merece nem a cristaliza­ção de uma forma de poder potencialm­ente perigosa nem a instauraçã­o de um debate com caracterís­ticas tão ferozes a meio de uma época desportiva que lhe está a correr positivame­nte.

Entre o elitismo desenfread­o e o populismo na sua expressão mais hedionda talvez resida o futuro do Sporting. É isso que cabe, hoje, aos sócios decidir. *Texto escrito coma antiga ortografia

 ??  ?? EU, BRUNO. O Sporting acabava de dar a volta a um jogo que teve uma primeira parte complicada, registando um resultado muito positivo na Liga Europa. O presidente, mais uma vez, chamou para si próprio as atenções
EU, BRUNO. O Sporting acabava de dar a volta a um jogo que teve uma primeira parte complicada, registando um resultado muito positivo na Liga Europa. O presidente, mais uma vez, chamou para si próprio as atenções
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RUI SANTOS

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