O incrível almadense
NOVE GOLOS E CINCO ASSISTÊNCIAS EM 16 JOGOS OFICIAIS TRANSFORMAM RICARDO HORTA NUM DOS GRANDES PROTAGONISTAS DA TEMPORADA. O INÍCIO DE EXERCÍCIO SUPERLATIVO DO MÉDIO-ALA/EXTREMO COLOCA-O INEVITAVELMENTE NA ROTA DO REGRESSO À SELEÇÃO A, NUMA ALTURA EM QUE RAFA, CURIOSAMENTE O JOGADOR QUE SUBSTITUIU EM BRAGA, ESTÁ LESIONADO
Foi nas escolinhas do Ginásio de Corroios, na margem sul do Tejo, que o almadense iniciou o seu trajeto no futebol de formação. O talento invulgar conduziu-o, com apenas 9 anos, ao Benfica, concretizando precocemente o sonho de representar o clube do coração. Foram sete temporadas, entre as escolas e o segundo ano de juvenis, ao lado de Bernardo Silva, João Cancelo, Rony Lopes, Hélder Costa, Bruno Varela, Diego Lopes e Fábio Cardoso, passando pelas mãos dos treinadores Luís Nascimento, Renato Paiva e Bruno Lage. Só que o futebol carregado de habilidade, de virtuosismo técnico e de velocidade foi punido pela estrutura física baixa, débil e com escassa massa muscular. Um equívoco, tantas vezes repetido, que serviu como mote à sua dispensa na passagem para o escalão júnior.
O golpe foi duríssimo, mas o sonho de se tornar futebolista profissional não se esmoreceu. Ricardo rumou a Setúbal para representar o Vitória, e após um primeiro impacto lancinante, ao conhecer uma realidade bem distinta da que estava habituado, o que lhe custou um período de escassa utilização, foi paciente e não baixou os braços, ganhando espaço até se tornar em protagonista. Algo que se tornou demasiado evidente no segundo exercício ao serviço dos juniores sadinos, ao apontar 22 tentos no Campeonato Nacional da categoria, o que não só lhe abriu as portas das Seleções Nacionais, estreando-se, em Freamunde, com um golo ante a Geórgia, no escalão sub-19, como também motivou a sua promoção à equipa principal do Vitória, debutando, sob o comando técnico de José Mota, numa deslocação ao terreno do Rio Ave.
A afirmação definitiva no patamar sénior dar-se-ia no exercício seguinte, principalmente a partir do momento em que José Couceiro assumiu o comando técnico do Vitória de Setúbal, como atestam os sete golos e quatro assistências rubricados, entre dezembro de 2013 e maio de 2014, na 1.ª Liga. O estatuto de revelação encaixava-lhe como uma luva, e, apesar do seu nome surgir na rota dos grandes, acabaria por ser o Málaga a afiançar, a troco de 500 mil euros, o seu concurso. Contudo, depois de uma primeira temporada em que foi utilizado com frequência por Javi Gracia, treinador que até há pouco mais de um mês comandava os ingleses de Watford, o que até motivou a sua estreia pela Seleção A numa receção de má memória à Albânia (0-1), que ditou o despedimento de Paulo Bento, Ricardo Horta perderia espaço na segunda época ao serviço dos boquerones, o que aguçou o seu ensejo de regressar ao futebol português.
O Sporting de Braga seria o seu destino, até porque os guerreiros do Minho procuravam um sucessor para Rafa, transferido por 16 milhões de euros para o Benfica. Uma aposta de sucesso, atestada por três épocas de altíssimo nível, em que foi praticamente sempre opção principal com Abel Ferreira, Jorge Simão ou José Peseiro, mas que não encontram similitude com um rendimento tão superlativo como o que tem vindo a alcançar no quarto exercício no emblema bracarense, já com Ricardo Sá Pinto como treinador, como comprovam os nove golos e cinco assistências em 16 jogos oficiais em 2019/20. O que o metamorfoseia não só na principal figura da equipa, como também num dos principais protagonistas da temporada, com o brilho transcendental das suas prestações na Liga Europa – seis tentos em seis jogos – a aguçar a cobiça fora de portas.
Médio-ala/extremo-esquerdo destro, também capaz de partir do corredor direito ou de atuar nas costas do avançado, Ricardo Horta consegue conciliar velocidade, agilidade e poder de aceleração com sagacidade a assumir ações de condução e de desequilíbrio, tirando partido do seu virtuosismo técnico e qualidade no drible para ultrapassar adversários, como que vivendo num constante namoro por transportar o futebol de rua para o relvado. Extremamente sagaz a produzir ações de desmarcação, tanto para o espaço entre as linhas defensiva e intermediária do rival, como para o interior da área adversária, quase sempre a partir de movimentos na diagonal, tem vindo a refinar contundentemente a sua tomada de decisão, o que o torna num finalizador exímio, pela espontaneidade no remate e ferocidade a atacar o espaço, dentro ou fora da área, entre lateral e defesa-central. Além disso, está cada vez mais estável na criação, proporcionando, através de passes de rutura e de cruzamentos, várias assistências para situações de finalização.