A OPA, de novo
Depois de um silêncio ensurdecedor aquando do lançamento da OPA, apenas pontuado por um comunicado à CMVM equívoco, na sexta-feira, Luís Filipe Vieira esclareceu algumas questões relativas à operação. Custa perceber que se tenha deixado campo aberta à especulação, perante uma operação polémica.
Como aqui escrevi a semana passada, esta OPA suscita dois tipos de questões: a opacidade da operação e um eventual conflito de interesses.
A este propósito convém revisitar o comunicado preliminar à CMVM. No seu ponto 9 é dito que o preço oferecido por ação visa assegurar que os acionistas que adquiriram as suas ações em 2001 as possam vender a um preço semelhante ao preço de subscrição (5 €). Não é acrescentada qualquer sugestão sobre os motivos da oferta, mas, num segundo comunicado, é aduzida a vontade de prevenir uma OPA hostil.
Decorridos dez dias, Vieira deu uma explicação plausível (que era, aliás, uma das possibilidades que tinha aventado no meu texto do Record): o Benfica quer criar as condições para a entrada de um parceiro estratégico na SAD e, para tal, precisa de ter uma posição ainda mais significativa do que a atual, de modo a poder alienar uma parcela do capital num futuro próximo.
Se assim é, qual foi então o motivo para, inicialmente, se sugerir que o motivo da OPA era compensar os investidores iniciais, quando tudo aponta que o propósito era, sim, ficar com as posições dos acionistas com participações qualificadas, adquiridas recentemente, por valores bem inferiores aos mil escudos de 2001?
Aliás, se se queria compensar quem investiu em 2001, seria necessário acrescer ao valor de compra os custos de parqueamento das ações e atualizar com a inflação. É verdade que a cotação bolsista nunca superou os 5 euros e que o mínimo histórico foi de 0,41 cêntimos, mas, de acordo com o ‘Negócios’, para que os acionistas de 2001 recuperassem o investimento, o valor atualizado à inflação seria de 6,77 e o preço justo teria de rondar os 7,5 euros. Bem acima do
ESTA OPERAÇÃO TEM SIDO MARCADA POR UMA
valor da OPA, e certamente abaixo do valor real do Benfica. Resta saber, por isso, se este processo de lançamento da OPA, apresentado como uma quase operação coração – que nem sequer, de facto, é –, garante, no fim, que os acionistas qualificados, com participações recentes, vão alienar as suas posições.
Sobra o conflito de interesses. Continua por explicar a razão para que os membros dos órgãos sociais do Benfica tenham fixado o preço de uma venda futura das suas participações. Se confiam na sua gestão, na valorização da SAD e nos ganhos que uma entrada de um parceiro estratégico pode trazer, não deveriam ter deixado que o mercado funcionasse, determinando o preço das ações quando as pudessem vender?
Até ver, esta OPA, mesmo que tenha um propósito racional e estratégico, tem sido marcada por uma comunicação atabalhoada e equívoca, incompatível com uma operação desta natureza. Com uma agravante, este processo pode mesmo inviabilizar a sua desejável concretização.