Record (Portugal)

A queda do Vitória

DESCIDA DOS SADINOS NA SECRETARIA É O RESULTADO INEXORÁVEL A QUE O VITÓRIA DE SETÚBAL ESTAVA HÁ MUITO CONDENADO. POR UMA ATUAÇÃO CRIMINOSA DOS DIRIGENTES QUE MANDARAM NO CLUBE NOS ÚLTIMOS VINTE ANOS

- Eduardo Dâmaso Diretor da revista Sábado

çAprendi a gostar de futebol vendo o grande Vitória de Setúbal dos anos 70. Devia ter aí uns 9 ou 10 anos e, para mim, não havia maior beleza do que ver Jacinto João a partir da linha e a fintar meio mundo para marcar golos ou meter a bola na cabeça do Bom Gigante, o inesquecív­el José Torres. Quem consegue alguma vez esquecer o verdadeiro rei da área que foi Vítor Baptista, o futebol inteligent­e de Octávio Machado no centro do campo ou a linhagem de grandes guarda-redes que vinham pelo menos de Félix Mourinho e Joaquim Torres!?

Mais tarde, já nos anos 80, o Bonfim também presenciav­a verdadeiro­s hinos ao futebol com aquelas equipas em que pontificav­am o Jordão, Manuel Fernandes, Eurico, Quim, Yekini, Meszaros, Vítor Madeira, Jaime Pacheco ou Mladenov. Por esses tempos de glória, porém, começavam a emergir os traços de uma decadência duradoura. O Vitória de Setúbal, dos finais dos anos 90 em diante, passou a ser o joguete de poderes diversos e de gente oportunist­a, que está no futebol para servir-se e tratar da vida.

Desde o célebre negócio que entregava o Estádio do Bonfim a uma das sociedades manhosas do BPN e tornava o clube cliente de um campo fora da cidade e, sabe-se hoje, em zona de terrenos industriai­s contaminad­os, até à circulação de sacos de dinheiro pelas instalaçõe­s do clube, comissões em cascata e um carrossel de fornecedor­es que eram, essencialm­ente, empresas detidas por alguns dos dirigentes do clube, tudo por ali aconteceu.

Basta ler um dos célebres Planos Especiais de Revitaliza­ção (PER) para perceber o enleio a que estava preso um dos maiores clubes da história do futebol nacional. A face negra da atual casta de dirigentes que pululam por uma grande parte dos clubes portuguese­s esteve no Bonfim durante as últimas duas ou três décadas. Cobiçavam os terrenos do clube e as rendas que os negócios da compra e venda de jogadores hoje representa­m. Ainda por ali ecoam muitas estórias da célebre venda, em 2009, de Cissokho ao FC Porto por 300 mil euros, que em menos de seis meses o despachou por 15 milhões para o Milão.

Esta descida de secretaria até pode ser injusta, sobretudo para uma equipa que a evitou no campo. Mas ela é o resultado inexorável a que o Vitória de Setúbal estava há muito condenado. Por uma atuação criminosa dos dirigentes que mandaram no clube nos últimos 20 anos.

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